O discurso proferido por Sócrates na 61ª Sessão da Assembleia Geral da ONU é uma das suas peças oratórias mais demagógicas. Digna de enfileirar ao lado da promessa eleitoral de que ia baixar os impostos (onde acresce o ónus de ter inspirado o actual primeiro ministro da Hungria).
Só que a treta dos impostos foi vendida domesticamente e a malta já a esqueceu (em parte, por méritos demonstrados na engenharia da governação). Mas a bravata retórica na ONU é mais grave, muito mais grave, na exacta medida que é uma mentira exportada no supremo fórum da comunidade internacional.
Não tem o mínimo fundamento dizer-se que “Portugal tem feito esforços para que o continente africano não caia no esquecimento” como igualmente nada fundamenta invocar a falácia de uma “estratégia conjunta euro-africana” ou que, sequer, “a União Europeia tem vindo a reforçar a sua parceria e estratégia conjunta com África”. Para não falar do seu enaltecimento, que lhe devia provocar a queda de dois terços dos dentes da boca, desse órgão faz de conta que é a CPLP.
Portugal sempre teve relações difíceis com África. Primeiro, por estadia demasiada e abusadora. Depois, pela herança dos complexos de culpa das malfeitorias seculares e pelos ímpetos revanchistas de ter de lá saído com um valente pontapé no cú. Com o passar do tempo, Portugal cada vez tem menos a ver com África e a África cada vez tem menos a ver com Portugal. E isto, admito, mais pelo facto de que África está cada vez mais corrompida e menos governável. E esta realidade não pode ser mascarada pelos negócios ou pelo assobiar perante o perdurar de sistemas de tirania nas antigas colónias. E nem a grande excepção, Cabo Verde, possibilitou ou foi aproveitada para o tornar num caso exemplar de cooperação pós-colonial. E se Cabo Verde tão próxima continua tão longe, o que dizer do resto onde o que sobra, enquanto os laços da língua e da história vão definhando, é um ou outro negócio mais de um sentido que noutro em que a grande “excepção” é a nomeação do angolano presidente da Sonangol para o Conselho de Administração da Galp (sempre o petróleo como a grande excepção).
Os laços fortes e mais impositivos da relação de Portugal e da União Europeia com África estão na lide com o fluxo migratório africano (o legal e sobretudo o clandestino). Muito difícil, com altos e baixos, tensões e distensões, em que avulta a forma sábia como Zapatero, a braços com o influxo mais grave, tem demonstrado saber lidar. A África está a entrar Europa dentro. Muito pelo desespero devido à forma inábil ou relapsa como a Europa não entra, por não saber ou não querer, em África. Sobretudo pelo mal do despotismo corrupto que tomou conta da maior parte de África. A demonstrar que o que permaneceu, como lição europeia em África, foi o pior da prática colonial.
Era disto que Sócrates devia ter falado na ONU. Ajudando a definir uma estratégia que resolva o problema da globalização da miséria africana e que é, não há que fugir-lhe, um remorso, um problema e uma ameaça para a Europa. Miséria essa em que, historicamente, a Europa tem as maiores culpas e responsabilidades. Antes e depois da descolonização. Primeiro pelo chicote dos negreiros, depois pelos negócios com as máfias locais que substituíram o anterior papel desempenhado pelos chefes tribais africanos que connosco se entenderam a vender-nos os escravos seus patrícios. Em vez disto, falar disto, propor correcções a isto, tecer antes loas ocas à sigla da CPLP é pura demagogia autista. Sócrates voltou a mentir. E a fugir com o rabo à seringa. Demonstrando que não conseguiu superar a herança da velha e clássica “estupidez africana” de Mário Soares que, pelo visto, contaminou duradouramente o PS. Não é a primeira vez que Sócrates mente. Mas, agora, mentiu na ONU. Pior. Muito pior.
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