Violeta, uma visitante deste blogue deixou na “caixa de comentários” um trecho interessante de uma tese de doutoramento, da autoria da investigadora Rosa Cabecinha, resultado de um estudo do relacionamento entre jovens portugueses e angolanos no espaço português. Pelo seu interesse, sobretudo como as aparências são desmontadas, puxamos essa transcrição para aqui:
"Se é inegável que se registou uma evolução no conteúdo dos estereótipos – os portugueses evitam caracterizar os angolanos com traços muito negativos e, em alguns casos, caracterizam-nos com traços mais positivos do que o seu próprio grupo - esta transformação opera-se a um nível superficial e não a um nível profundo. De facto, esta metamorfose em que a xenofobia parece ter dado lugar à xenofilia (o culto do exótico) esconde uma flagrante permanência: as dimensões mais valorizadas nas sociedades ocidentais (autonomia, individualidade, competência, responsabilidade) continuam a ser negadas ao grupo minoritário. A manutenção dos significados associados aos estereótipos torna-se particularmente evidente quando consideramos as dimensões de conteúdo exclusivas de cada grupo: a instrumentalidade e a dominância para o grupo dos portugueses e a expressividade e o exotismo para o grupo dos angolanos.”
”Outro aspecto a salientar diz respeito aos papéis que são atribuídos a cada um dos grupos: aos portugueses são associados traços que remetem para um papel activo na sociedade (trabalhadores, dinâmicos, empreendedores, etc.), enquanto que aos angolanos são associados traços que remetem para um papel decorativo ou lúdico (cheios de ritmo, musicais, sensuais, etc.). Este papel lúdico atribuído aos angolanos constitui também uma forma de permanência, se o virmos à luz das representações do ‘negro’ durante o período do colonialismo. Assim, o predomínio de traços juvenis e exóticos nos angolanos, denuncia a permanência da oposição entre a alegada ‘especificidade’ destes e a suposta ‘universalidade’ de portugueses."
"Globalmente, os resultados dos diversos estudos demonstram que o racismo sofreu uma metamorfose nas suas formas de expressão. O racismo actual manifesta-se essencialmente pela negação do reconhecimento da singularidade do outro, ou seja, pelo tratamento dos membros das minorias não como ‘indivíduos’ mas simplesmente como ‘representantes’ de uma categoria homogénea. Este processo manifesta-se num tratamento mais automático da informação relativamente a estes grupos, isto é, mais baseado nos estereótipos sociais. Os membros das minorias tornam-se ‘invisíveis’ enquanto pessoas, mas extremamente ‘visíveis’ enquanto grupo."
Aconselho vivamente a leitura integral da tese de Rosa Cabecinha, disponível aqui. E, mais uma vez, muito obrigado à Violeta pela ajuda na descoberta deste texto.
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