O Manuel Correia confirmou que é um prazer conversar com ele. Sobretudo quando nos desentendemos. Pelas razões que ele bem explica no intróito do seu comentário a este post e que convido à sua leitura.
Não vou insistir nas questões demasiadamente entrincheiradas das nossas posições. Sobre essas, proponho que deixemos assentar a poeira, pois, infelizmente, o drama no Médio Oriente está para lavar e durar. E pressinto que as voltas que vão ocorrer nos trágicos acontecimentos que nos perturbam, e é por isso que sobre eles falamos, vão obrigar um e outro a removermos algumas posições demasiadamente plásticas que bloqueiam eventuais caminhos para, agora, melhor nos entendermos. Pela minha parte, como sempre, confirmo que nunca tenho posições definitivas sobre nada, muito menos sobre uma tragédia. Que mais não seja por respeito para com as vítimas.
Neste espírito pacificador e de confiança nos benefícios da distanciação, escolho, se me é permitido, como continuação do debate, dois dos tópicos que ele considera nucleares (ou seja, dou ao MC a escolha dos tópicos importantes, eu escolho na escolha dele aqueles a abordar e a contornar no momento):
1. Diz o MC: “A história do Estado de Israel tem de ser recapitulada. Temos de recordar o que aconteceu naquela região desde o fim da 2ª Grande Guerra.”. Duvido que leve a alguma solução pacífica o revisionismo histórico (ou recapitulação histórica) das origens dos estados e nações e seus actuais traçados. Dois exemplos que podem tornar catastrófica esta via - a Conferência de Berlim que dividiu África ainda não foi há muito tempo; ontem mesmo a Al Khaeda falou na reconquista islâmica urgente da Andaluzia. Mas como este meu temor pode ser um exagero, dou umas parcas achegas à “recapitulação” proposta:
1.1. Obviamente, a ideia sionista que levou à criação do Estado de Israel no então protectorado britânico da Palestina obedeceu a um sentimento profético étnico-religioso e ao desejo de autodefesa e de desforra catárquica pelo sofrimento e sentimento de culpa de cobardia do Holocausto. Assim, a terra de origem era-lhes vista como a terra da redenção.
1.2. Na luta, com uma forte componente terrorista, para a imposição da existência do Estado de Israel, os judeus defrontaram os britânicos e os árabes. Foram sobretudo financiados pela rica e numerosa comunidade judaica nos EUA (esta é a base historicamente objectiva que desde sempre até hoje sustenta a aliança Israel/EUA). Ganharam, sabendo que eram altas as probabilidades de perderem o que tinham conquistado.
1.3. Foi decisivo, na aprovação e consolidação do Estado de Israel, o apoio então dado pela URSS que foi, recorde-se, o primeiro Estado a reconhecer Israel e teve protagonismo na sua admissão na ONU. Os motivos deste apoio decisivo são óbvios – os judeus lutavam contra os imperialistas britânicos; a maioria das elites árabes estava fresca nos seus sentimentos germanófilos que a tinham levado a simpatias pró-nazis; a filosofia da prática social israelita tinha fortes componentes de semelhança com os estereótipos da colectivização soviética (kibutz versus kolkhoses); Israel permitia a existência de um forte Partido Comunista de Israel; alívios de vários tipos por muitos judeus soviéticos saírem portas fora para habitarem em Israel.
1.4. A viragem da URSS da sua posição pró-Israel para a entrada posterior deste Estado no catálogo dos inimigos imperialistas segundo os soviéticos e a abater, deveu-se à consolidação da aliança Israel/EUA, numa fase de agudização da “guerra fria”, e um redesenho da política de alianças da URSS no Médio Oriente (via “socialismo árabe”) a partir do “nasserismo” e a propagação da sua influência nos outros países árabes, em que a espinha dorsal geoestratégica passou para a aliança Egipto/URSS e a proliferação dos Partidos Baas cujos ramos eram comandados por “militares progressistas” e que substituíram, nas preferências soviéticas, os próprios partidos irmãos do PCUS (os Partidos Comunistas nos países árabes). Entretanto, a causa da Palestina e a OLP passaram, além de carne para canhão da política soviética e anti-israelita, a representar o zénite da propaganda comunista na apresentação do modelo de combatentes e de mártires na causa dos “movimentos de libertação”. Até hoje.
Proponho que completes a lista. Ou a corrijas.
2. Diz o MC também “O que tem sucedido no Médio Oriente tem sido algo que se assemelha estranhamente com o que aconteceu na Europa entre 1918 e
Já vai longa a fala. É tempo do abraço protocolar mas sincero. Aqui vai ele, caro Manuel Correia.
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