A intervenção de ontem de Luís Amado na Assembleia da República, sobre a crise no Médio Oriente e o papel a desempenhar por Portugal e pela UE, pela sensatez, clareza e firmeza, demonstra que, finalmente, temos Ministro dos Negócios Estrangeiros.
No essencial, Luís Amado disse o que havia a dizer – se queremos ter moral para lamentar as vítimas e condenar os abusos, provocadas e cometidos de uns e outros dos vários lados, contribuindo para que umas e outras terminem, temos de “dar o corpo ao manifesto”. Porque não passa de pura demagogia disfarçada de sentimentalismo, ficarmos pela exploração choramingas sobre as vítimas e os abusos dos fortes para batermos nos do costume (claro, os “américas” e os judeus) e depois defender-se a “não intervenção”. Porque, de facto, a arrogância imperial e belicista dos Estados Unidos e de Israel, deve-se em grande parte à inacção hipócrita da Europa, traduzida na condenação, nas marchas e desfiles, na repugnância higiénica perante a guerra e o uso da força, demonstrando afinal, perante quem ataca a civilização e a democracia, que não arrisca um dedo para se defender. O que, no fundo, confirma um velho vício europeu próprio de tartufo (ou de parasita) - deixamos para a América a tarefa de nos defender as costas, o bem estar, os usos e costumes, para depois lhe condenarmos a forma abusiva e desbragada como usa a força, mordendo-lhe a mão de protecção ao gritar-lhe “terroristas são vocês”. O nosso direito, como europeus, à superioridade moral perante os abusos exige o fim desta estratégia oportunista e o assumir pleno das responsabilidades na contenção dos abusadores. Todas as responsabilidades - as políticas e as diplomáticas, sabendo-se que uma e outra só serão mais que retórica se tiver o poder de uma força que as sustente. E, indo-se lá, com a diplomacia e a força, está bem de ver, é para levar e dar.
A racionalidade política e diplomática de Luís Amado representa uma mudança significativa para aplauso e fazendo esquecer os tempos recentes em que o MNE se dedicava ao sincretismo teológico da impotência e da tolerância para com os intolerantes. Afinal, uma doença ou um cansaço, ou ambas as coisas, mais ou menos diplomáticas, vieram bem a calhar num Palácio das Necessidades que estava a ficar pateticamente inútil e ridículo.
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