O imaginário popular encontra quase sempre um cantinho para se exprimir. Representando a sua cultura, a cultura possível, uma cultura subterrânea que vai do rasca até ao sublime. Por ali passam os medos, quantas vezes aflitos, o marialvismo serôdio, crenças e superstições, o grito de luta ou só de alerta, o desconchavo, o ímpeto poético. Umas vezes, não passa do conformismo e de repetição da catequese dos amos. Noutras, é ou tenta ser, impertinente. Sempre
naif.
Até a decoração de um barco moliceiro, para as bandas da ria de Aveiro, pode servir de descarga do imaginário da malandrice que reproduz, afinal, os estereótipos da cultura
underground recheada dos ditos que, na taberna, intervala duas rodadas de copinhos e que fora atirada, com os olhos, a uma bunda vistosa que, apressada, subia a Calçada.
Com a devida vénia, não resisto a roubar ao notável
Fumaças esta preciosidade.
Já agora, minha querida
Guida, esta decoração deve ou não entrar no catálogo do nosso Património "invisível"?
Adenda: A imagem teve direito a destaque
aqui. Claro que o mérito inteirinho pertence ao verdadeiro artista - o
João Carvalho Fernandes.