
Cemitério à medida da cidade, ontem na periferia, hoje encravado cidade dentro.
Os cairotas, no seu culto aos mortos, tratam-nos como se estes tivessem necessidades de habitação. Visitam-nos regularmente, em bando familiar, para com eles conviverem e partilharem refeições. Porque imaginam que a solidão dos mortos é desolação que ninguém merece.
Constroem mausoléus que permitam a instalação do convívio entre vivos e mortos. Contratam guardas para cuidarem dos mausoléus dos seus e zelarem pela sua conservação e contrariarem ímpetos de saque.
Muitos dos guardas das habitações dos mortos encontraram ali melhores instalações de habitação que nos tugúrios de subúrbio. Depois, muitos familiares, demandando sítio para estar na capital, foram-se acolhendo a esses
apartamentos. Falaram-me num número actual de habitantes vivos do cemitério entre cem mil e um milhão de vivos. Quem vive e onde vive, procura melhorar a sua qualidade de vida, e assim se foram electrificando os mausoléus e dando-lhes outras mordomias.
Continuam na
cidade dos mortos e dos vivos, a viver muitos e a enterrar outros tantos. Coabitação, pois.