Felizmente, para cada tema, muitas são as sentenças. Nada que tenha que intrigar. Ou, sequer, que seja estranho. Porque não há um formato para o pensamento. Nem para a opinião. Tão simples quanto isso.
O Miguel e outros(as) estão em discordância comigo e com outros(as), sobre a questão das “quotas” e da “paridade” que, por via legislativa, se pretendem proporcionar às senhoras portuguesas. Normalíssimo. Mas, se ele me permite dizer assim, o seu último post sobre o tema tem não só uma alta dose de sofisma como de juízo de intenções sobre o pensamento divergente. Além de que, “trabalhando” o raciocínio da opinião oposta, caricaturando-a e deformando-a, tenta “facilitar” a defesa da “sua dama”. E o uso destes expedientes por parte do Miguel é que me intrigou, tendo-o eu, como tenho e mantenho, na conta de um cavalheiro na arte da discussão e do exercício do contraditório.
Porque a questão, caro Miguel, não é qualquer preconceito de que as senhoras não saberão fazer bom uso das “quotas”. Se, como nos casamentos, for “de sua livre vontade”. Ou sequer se merecem estar em “paridade” ou mesmo em “supremacia”, em toda ou qualquer actividade ou exercício de poder. Essas são ideias já da pré-história do machismo. As questões são outras e bem simples - primeiro, as senhoras devem ser libertas da suspeita de chegarem onde chegam (e, por mérito delas, cada vez chegam e chegarão a muito mais) à pala da asa protectora das “quotas”; segundo, a ascensão por mérito deve ter por base a vontade da ascensão e do uso da ribalta. Porque, quando as senhoras não querem, em paridade de opção com os homens que o desejam, ser militares, polícias, presidentes de câmaras, deputadas ou dirigentes partidárias, isso é, deve ser, um exclusivo problema delas. E quantas são as vezes em que não o querem por compreensíveis razões “higiénicas” e que só ilustram a recusa. Assim como um “voto em branco” tem o mesmo valor de opção que um voto numa lista ou numa personalidade. Impor a “paridade” para ultrapassar problemas de vontade, só pode dar numa “pesca forçada” para “preencher quotas”, em que, forçosamente, o mérito real cede perante o paternalismo da paridade “martelada”. Que, no mínimo, contamina por igual da suspeita de protecção se fulana ou sicrana chega onde chega por mérito ou por “falta de melhor”.
Bem sabemos todos, os “pelas quotas” e os “contra as quotas”, que o busílis da questão está na desigualdade de condições sociais, económicas e culturais, mais a disparidade na repartição das obrigações domésticas e do trato dos filhos, entre os cavalheiros e as damas. E o problema maior, que indisponibiliza grande parte das mulheres para o exercício de cargos partidários, é que, na esmagadora maioria dos casos, as mulherem sofrem (somando o trabalho profissional com o trabalho doméstico e o tratamento dos filhos) de uma "carga de trabalho" muito superior à dos homens. Com uma boa ajuda de quase todas as religiões, onde, por regra, mais se difunde o atavismo serôdio da “inferioridade feminina” ou até do “pecado feminino”. E a luta contra tudo isto, os nós do problema, é que não deviam ter tréguas, nem sequer descanso. Resolver o problema “por cima”, administrativamente, acaba por, afinal, mascarar as causas reais da falta de paridade, a de facto. Congelando a evidência das causas da desigualdade. Se isto é um preconceito, então é por este preconceito que estou contra a menorização das senhoras, conservando-as no tempero avinagrado da sua “promoção” pela condição de pertencerem a uma “espécie protegida”.
Abraço, caro Miguel.
Adenda: A ler, em "contraditório", a tréplica do Miguel. Por mim, as diferenças de pontos de vista estão perfeitamente aclaradas. Ao fim e ao cabo, julgo, trata-se de uma questão de "vias" para chegar ao mesmo fim. E, sendo assim, afinal, a polémica até o foi muito pouco. É mais problema de "trânsito" que de opinião. E é por isso mesmo que não me parece justificar-se a tal Lei.
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