
Este desconcerto governamental, pela péssima utilização das sanfonas no trato dado à pauta da causa pública, ultrapassa qualquer noção de esquerda-direita.
Com Durão-Portas, havia a noção de estarmos perante o governo mais à direita desde a reinstalação da democracia. Agora, a dupla Lopes-Portas evidencia mais desarranjo e leviandade que um qualquer posicionamento no espectro político. Porque o mais evidente e saliente é a incompetência e a falta de decoro em dela não ter vergonha, quanto mais emenda. Até nos esquecemos da água que eles levam à azenha dos interesses instalados. Porque a água é tanta que inunda os ministérios e já salta das janelas.
Falou-se muito do perigo do
populismo a propósito da liderança Santana Lopes. E do perigo que representava a eventual adesão
popular a uma prática de governar sem referências nem carta de marear, dando o primado ao trato das circunstâncias segundo as marés. Mas aquilo a que se assiste está longe de aí chegar. Ficarão as intenções mas falta o talento para o engano e para a eficácia da demagogia. Porque o trato da propaganda e do afagar o pelo requer um suporte que este governo visivelmente não consegue caboucar.
O risco maior agora é baixar-se demasiado a bitola da medida da qualidade da governação. Ou seja, qualquer alternativa, por fraca que seja,
serve. E se este risco funciona
à direita (podendo dar lugar à tentação de experimentar uma direita forte e com norte), idêntico pode suceder em contágio
à esquerda. Traduzindo por miúdos, impulsionar o PS, sob liderança de Sócrates, à falta de exigência e de rigor pela fraca qualidade do contraponto. A preguiça na esquerda sempre levou à sua descaracterização. E a preguiça, na política como em tudo o mais, sempre foi mal apetecido. E contagioso. No caso, até podem dar-se recaídas. Para mais, o tal
centrão dos quinhentos mil eleitores que decidem as vitórias (votando ora PS ora PSD), é ele próprio a expressão mais acabada (e
suporte eleitoral) da preguiça democrática. Veremos se, à esquerda, a herança do
santanismo não vai remoçar a probabilidade do regresso ao
guterrismo de triste e fresca memória. Cruzes canhoto.