No contexto das guerras coloniais (1961-1974), a tomada pelo PAIGC, em 1973, do quartel português de Guileje (os guineenses designam-na como Guiledje, povoação do Sul da Guiné-Bissau, junto à fronteira com a Guiné-Conacry) constituiu o principal feito militar dos guerrilheiros dos movimentos de libertação africanos contra o Exército Colonial de Portugal. E, simbolicamente, representou o momento histórico em que, do ponto de vista militar e político, Portugal perdeu o império colonial que, pela metralha e pelo sangue, quis conservar ao arrepio da história. Até porque há uma linha de continuidade e crescendo que vai da tomada de Guileje (juntamente com o fim da liberdade de uso do espaço aéreo no território guineense e a declaração da independência da Guiné-Bissau em Madina do Boé) até ao golpe militar de 1974 em Portugal. Pois terá sido com o desastre de Guileje que os militares portugueses percepcionaram definitivamente que as guerras coloniais estavam perdidas e só a deposição dos governantes, incapazes (ou impossibilitados) de encontrar uma saída política que permitisse a descolonização, podia salvá-los da humilhação da derrota sangrenta nos terrenos de combate. E a chave do drama da descolonização portuguesa, mais que nas peripécias posteriores do nosso abandono africano de 1974 e 1975 e em que retornámos à Europa, está na construção do quartel em Guileje e depois no seu abandono por derrota militar. Quisemos ganhar pelo ferro e pelo fogo e, com eles, perdemos. Sobretudo ali, em Guileje, o nosso maior calcanhar colonial.
Numa iniciativa original e deveras interessante, promovida por uma ONG guineense, envolvendo académicos e protagonistas militares, guineenses e portugueses, vai realizar-se em Bissau, entre 1 e 7 de Março do próximo ano, um Simpósio Internacional dedicado a Guileje. O programa está aqui.
Imagens: Logo do Simpósio e foto de 1971 (o autor quando oficial militar miliciano em Guileje, então ainda quartel militar português, numa experiência aqui referida)
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