Difícil é lidar com, quanto mais entendê-las, mentes brilhantes, incluindo, ou sobretudo, as mentes brilhantes académicas. Particularmente quando estas preferem surpreender além da capacidade comum em as entender, disfarçando melhor ou pior o cabotinismo próprio dos gurus predeterminados. Boaventura de Sousa Santos, um ilustre profeta desarmado de méritos firmados e bem caboucados na Universidade de Coimbra, homem que pensa o mundo além dos limites culturais, sociais e políticos próprios dos humanos, quando reflecte alarga o raciocínio em comprimento, largura e profundidade. Natural pois que, exorcizando os vícios que corroeram o socialismo, os socialismos, os velhos socialismos, esses mesmo que saltam coxos e marrecos perante o olhar e pensar do limitado homem vulgar de esquerda, causticado em decepções, encontrou uma listagem programática do “socialismo feliz”, o do século XXI, enunciando-a assim:
um regime pacífico e democrático assente na complementaridade entre a democracia representativa e a democracia participativa; legitimidade da diversidade de opiniões, não havendo lugar para a figura sinistra do "inimigo do povo"; modo de produção menos assente na propriedade estatal dos meios de produção do que na associação de produtores; regime misto de propriedade onde coexistem a propriedade privada, estatal e colectiva (cooperativa); concorrência por um período prolongado entre a economia do egoísmo e a economia do altruísmo, digamos, entre Windows Microsoft e Linux; sistema que saiba competir com o capitalismo na geração de riqueza e lhe seja superior no respeito pela natureza e na justiça distributiva; nova forma de Estado experimental, mais descentralizada e transparente, de modo a facilitar o controle público do Estado e a criação de espaços públicos não estatais; reconhecimento da interculturalidade e da plurinacionalidade (onde for caso disso); luta permanente contra a corrupção e os privilégios decorrentes da burocracia ou da lealdade partidária; promoção da educação, dos conhecimentos (científicos e outros) e do fim das discriminações sexuais, raciais e religiosas como prioridades governativas.
Belo programa, melhores intenções. Impulsionando uma vontade imediata e compulsiva de assinar ficha de inscrição e compromisso de imediata e brava militância recheada de vontades camaradas. O problema, pequeno grande problema, é saber onde mora a sede de recolha de adesões a este depurado socialismo do século XXI, autêntico paraíso da redenção social e política. E o problema começa e acaba aí. É que Boaventura de Sousa Santos envia-nos, para tal fim, a Caracas e Havana. Entregando-nos nas mãos do guia cristão-leninista Chavez. Ora, sendo assim…
[O texto completo do artigo de Boaventura de Sousa Santos pode ler-se aqui (*)]
(*) O artigo foi publicado na Folha de São Paulo em 21 de Maio de 2007 e depois repetido na revista Visão de 24 de Maio.
OS MEUS BLOGS ANTERIORES:
Bota Acima (no blogger.br) (Setembro 2003 / Fevereiro 2004) - já web-apagado pelo servidor.
Bota Acima (Fevereiro 2004 a Novembro 2004)
Água Lisa 1 (Setembro 2004 a Fevereiro 2005)
Água Lisa 2 (Fevereiro 2005 a Junho 2005)
Água Lisa 3 (Junho 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 4 (Outubro 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 5 (Dezembro 2005 a Março 2006)