Terça-feira, 15 de Maio de 2007

A GRANDE DISSIDÊNCIA COMUNISTA (3)

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Lido o livro de Raimundo Narciso sobre a dissidência da “terceira via” (*), fractura partidária sobre a qual aqui me pronunciei (este mais este post) antes de conhecer o conteúdo do livro, aqui ficam apenas breves notas sobre a sua importância para a história do comunismo português:

 

- As “feridas” da odisseia não perturbaram a serenidade de análise nem a reconstituição factual e das personagens, “tudo” está no livro (como eu e tantos outros os conhecemos, aqueles que puderam e quiseram conhecer).

 

- Nunca foi até ao momento publicada uma “descida” com a profundidade desta ao “interior” do PCP, aquele íntimo e essência partidária, nomeadamente o seu núcleo de poder real, que a duplicidade propagandística deste partido esconde dos cidadãos, incluindo a esmagadora maioria dos seus militantes, os que amam aquele partido, lhes entregam as maiores energias das suas vidas e lhe cumprem as tarefas, tanto que o poupam ao olhar crítico.

 

- Depois de se ler o livro, basta imaginar o que seria aquele núcleo dirigente, com ou sem Cunhal, mas segundo o “modelo” de Cunhal, no exercício do poder político, a mandar no país: Estaline e o Gulag estariam aqui.

 

(*) “Álvaro Cunhal e a Dissidência da Terceira Via”, Raimundo Narciso, Edições Âmbar. O livro será apresentado publicamente no próximo dia 17 de Maio, às 18h30, na FNAC (Chiado) por Mário de Carvalho e Mário Lino. Sobre o livro, visitar este blogue.

 

Imagem: Raimundo Narciso quando ainda era considerado por Cunhal. Aqui, a ladeá-lo na delegação do PCP enviada ao funeral do Marechal Tito.

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Adenda: Recomendo a consulta da "nota de leitura" deste livro editada pelo historiador Rui Bebiano.

Publicado por João Tunes às 13:04
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2 comentários:
De JMC a 15 de Maio de 2007
Ainda não li o livro do Raimundo Narciso. Muito provavelmente, irei ler, por curiosidade.
Não tenho boa impressão dos dissidentes que se mudaram de armas e bagagens da militância no PCP para outras militâncias sem terem efectuado profundas reflexões políticas e ideológicas. Não que a mudança seja sinónimo de oportunismo, mas porque a dissidência foi, em muitos casos, mero capital para a troca.
Em geral, os dissidentes do PC padecem do mesmo cinismo de que acusam os dirigentes. Os seus relatos, que entre nós raramente chegam a qualquer reflexão ideológica, constituem justificações tardias de uma cegueira desejada, da qual, em boa verdade, os dissidentes parece não se terem curado.
Nos testemunhos vindos a lume, em muito poucos se vislumbra um laivo de auto-crítica. Os maus foram sempre os outros, que os teriam enganado, nunca os próprios dissidentes, que apenas acreditaram numa ideologia sublime e redentora. Mas afinal eles padeceram dos mesmos males de que acusam os dirigentes, acreditaram nas mesmas patranhas, difundiram as mesmas trapaças e praticaram os mesmos desmandos (muitas vezes contra outros dissidentes antes deles…).
O comunismo é uma coisa séria, não é mera utopia. É o desejo de controlo totalitário da sociedade por quem se julga iluminado, tocado pelo conhecimento certo, e dotado para conduzir as massas ignaras para a felicidade terrena. Pouco se distingue do fascismo salazarista, e no que se distingue é dele bem pior, porque fundado numa pseudo superioridade conferida pela fé no conhecimento da realidade social e do seu futuro histórico. Abjurá-lo não pode resumir-se ao repúdio das metodologias internas ou à crítica de hipotéticos desvios que teriam desvirtuado a imaculada utopia.
Tal como a adesão ao comunismo, para muitos, foi superficial, por adesão emocional à cartilha, assim o tem sido a dissidência. Por isso, os testemunhos não têm passado do relato de episódios picarescos.
De João Tunes a 16 de Maio de 2007
Caro JMC, como decerto esperaria, em pouco concordo no seu comentário. Pela generalização, pelo juízo moral, pelo reducionismo nos contextos. Aliás, tirando o ângulo ideológico, tem grandes similitudes com o reflexo defensivo da ortodoxia. Se quer ficar na sua, então não leia o livro do RN (decerto é isso que também farão os militantes satisfeitos do PCP e todos os que identificam sem apelo os dissidentes com os "vira-casacas"), poderia abalar as suas firmes convicções e, por honestidade intelectual, voltar aqui para, pelo menos, introduzir nuances nas suas sentenças tão lapidares (a propósito de um livro que não leu). É que está lá muito além do picaresco. Dito isto, resta-me agradecer-lhe a honra de partilhar as suas dissonâncias, ajudando a incrementar a pluralidade de pontos de vista. Volte sempre que a isso se dispuser (vc defende as suas damas com vigor mas com absoluta correcção).

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