O que se passou em França com o famigerado CPE, mais o seu desfecho, é um baú de ensinamentos. Assim se aprenda com ele - o baú do CPE frustado - e a democracia europeia corre o risco de ser mais adulta.
O CPE foi uma barbaridade da selvajaria de uma direita embalada no autismo. Nem sequer foi um arroubo neo-liberal. E tanto não o foi que o patronato francês o repeliu como um ademane fascistóide que não lhe calhava como brinco, menos ainda como necessidade. Dito de outro modo, chão e rasca, o CPE foi uma ideia paneleira saída da cabeça de um burguês governador que se considerou tão charmoso que entendeu ter o charme para dar, vender e ofender o charme mais indiscreto da burguesia, com o único e ridículo talento de conseguir virar toda a sociedade francesa contra o seu disparate. E não terá sido a última vez que um Grão Político com ambição de macho autocrata vai sair de cena a mostrar que afinal tem um cu remendado de saloio sendeiro.
A ideia peregrina, selvagem e paranóica de atribuir uma discriminação de “género” aos jovens no seu primeiro emprego, dando-lhe o ferrete da condição aleatória do vínculo laboral, só se poderia perceber se se conseguisse entender a patologia associada à praxis política abandalhada da representação extremada das pulsões destrutivas dos equilíbrios sociais ao serviço de uma pseudo ideia peregrina de modernizar através da imolação social. E, assim, apenas suicidária. E quando o patronato voltou as costas ao CPE só demonstrou aos políticos paranóicos franceses que, sem sociedade, não há mercado, nem lucro, nem sequer dinheiro, logo restando uma morte anunciada e nubente de burguesia e trabalhadores.
O frémito da sociedade francesa contra a CPE foi, antes do mais, um grito forte de desespero para que a França não se imolasse no luto insano do choro pela morte das suas diferenças e divisões, das suas fracturas e contradições, da sua pluralidade e segmentações, uniformizando-se na selvajaria e na terra queimada. Sabendo parar à beira do abismo dessa terrível obra de engenharia social que seria a institucionalização de um estigma sobre a sua juventude laboral. E só um parvo não terá percebido que este estigma seria o primeiro de uma cadeia (programada) de muitos outros, intermináveis, estigmas.
A Europa, não só a Europa do progresso, mas toda a Europa, só pode agradecer que a burguesia e a direita francesa tenha entendido que a estupidez não é a melhor forma de fazer política. Empurrada e bem, é claro e com os mil obrigados devidos, às forças vivas e do progresso, com provas renovadas de rebeldia indómita, da França esclarecida e do progresso, com lugar de honra merecida à sua juventude suficientemente rebelde para sacudir cangas de políticos de proveta, mais papistas que os seus papas, os dos dinheiros inventados, pueris porque representados na paranóia da sua multiplicação, como se o valor se criasse, acrescentasse, fora dos homens, das sociedades e da vida.
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