Em termos de orçamento 2011, as responsabilidades pelo saque não serão iguais quanto ao PS e ao PSD. Um vai atacar-nos o bolso esquerdo, outro trata-nos do bolso direito.
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Rui Namorado, militante socialista e grevista em 24 de Novembro, desabafou através de uma reflexão do “dia seguinte”. Vale a pena lê-lo com a atenção devida aos lúcidos.
As esquerdas parecem epicamente condenadas a degladiarem-se entre si. As direitas navegam em águas aparentemente mais tranquilas. Abaixam-se para ver se a tempestade lhes passa por cima e se no fim ficam mais fortes e as esquerdas mais fracas.
O sector dominante da esquerda institucional resmunga oficiosamente uma imagem de fracasso da greve que a realidade teimosamente desmente. Os sectores dominantes das esquerdas sociais desenham um cenário demolidor que, se tivesse a dimensão afixada, já teria varrido qualquer governo. Esgrimem entre si números como se o peso da greve não fosse o resultado de um balanço sócio-politico, mas um hipotético apuramento impessoal de uma luta entre números.
O primeiro parece acreditar que, se fizer os sindicatos morder o pó, poderá navegar tranquilamente numa imaginária harmonia, gerida pelos generosos e altruístas senhores do dinheiro, que lhes continuarão a deixar movimentar as alavancas do poder. Os segundos parecem acreditar que se destroçarem o sector dominante da esquerda institucional verão abrir-se as portas de um outro poder político, onde os interesses que defendem tenham verdadeiro eco.
Mas se os trabalhadores forem vencidos e os sindicatos aniquilados, na constância do capitalismo, nenhum governo de esquerda respirará sequer cinco minutos de poder institucional. E se a esquerda institucional dominante for desmoronada, seguir-se-ão governos de direita, cuja novidade será o agravamento brutal de tudo aquilo que fez com que os sectores dominantes das esquerdas sociais combatessem o sector dominante da esquerda institucional.
Por isso, esta greve teve também uma dimensão trágica. Ela fez-me recordar aquela história do sapo que para ajudar um escorpião a atravessar um ribeiro o transportou no seu dorso. Contudo, a meio da travessia o escorpião espetou o seu ferrão venenoso no sapo. E ferido mortalmente o sapo perguntou. "Porque me matas, sabendo que se eu morrer também tu morres". E o escorpião respondeu: "É da minha própria natureza". E morreram os dois.
Mas neste caso, é como se a história envolvesse dois pares de sapos e de escorpiões. Num deles é a esquerda institucional que faz de sapo; no outro, são as esquerdas sociais. O desenlace é o desaparecimento de todos, seja qual for o papel que desempenharam.
Há uma subtil ironia, impregnando tudo isto. Embora pareçam desconhecê-lo, para cada uma das partes, os problemas da outra são afinal também seus. E cada uma delas precisa da força da outra para que, a prazo, não fique irremediavelmente enfraquecida.
Reconheço que a probabilidade de isto ser entendido por qualquer das partes, é escassa. Possivelmente, cada um dos lados continuará a incensar a sua própria santidade e a construir infernos onde gostaria de ver o outro; a construir minuciosamente a culpa do outro e a inocência própria.
Mas quem conseguir despir o seu olhar, por um momento, da neblina das aparências mais prementes, facilmente verá que, se ambos os lados continuarem a intercambiar sucessivamente entre si os papéis de sapo e de escorpião, acabarão por se afundar.
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Quando o deputado Candal, no seu adeus ao parlamento, disse hoje: «Não tenho dúvidas em afirmar, neste momento, que o ponto mais sólido que nós temos à nossa disposição é a resistência do primeiro-ministro que está em funções», obviamente que quis causar impacto através do sublinhar de uma evidência, no sentido de demonstrar porque é que o PS ainda é governo. Mas se falou verdade, Candal expôs, transformando a sua despedida num adeus envenenado, a essência grotesca do absurdo acantonado no poder, a de um governo que está entregue às malvas, esperando pela infusão que facilite limpezas íntimas, simplesmente preso do desespero teimoso e idólatra de um alçado social e politicamente que pagou com esquizofrenia optimista a ascensão de um apagado e vil talento. E, por linhas tortas, Candal revelou como se deita abaixo este governo: abanem Sócrates o suficiente, o resto cai logo que arranquem a raiz solitária, porque PS propriamente dito, além do seu arrivista-em-chefe, deixou de existir por mor de esmagamento pelo umbigo deste.
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Dois problemas maiores de qualquer acção de luta habitam, por regra, nas tentações na hora do seu balanço. É a da chapa gasta dos burocratas louvaminhas que coleccionam "sucessos da luta de classes" como se fossem cromos da bola. Também a dos cépticos sistemáticos que pedem mais além de mais. Assim, um balanço de uma greve geral é um apelo irresistível aos semeadores de lugares comuns e de estereótipos. Contra a corrente, o Rui Bebiano apresentou um conjunto de notas de reflexão sobre a greve geral de ontem que merecem serem fios para discussão.
O melhor da greve geral foi o envolvimento de novos sectores laborais normalmente relapsos a participarem neste tipo de iniciativa. Factor positivo, a que nem o empolamento cretino dos “mais de três milhões de grevistas” retira significado. Tanto mais que foi evidente que a greve geral se não foi máxima no sector público foi, isso sim, mínima no sector privado. E se revelou novas disposições de participação e luta, também salientou a forma enraizada como estão acantonadas as resistências à luta e à partilha de esperança em efeitos de mudança (a esquerda revolucionária e os sindicatos continuam incapazes de indicarem alternativas e muito menos de as construirem). E é por esta minha interpretação da semi-decepção na ressaca sobre a greve que julgo que o Rui Bebiano onde viu limitações por ausência de acções complementares (dando visibilidade e participação pública ao evento) ao acto grevista propriamente dito elevou as suas expectativas acima das possibilidades pelas limitações da greve em si mesma. As insuficiências estiveram “dentro da greve” e não por esta “não ter saído à rua”.
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Diogo Feio, do CDS/PP, no JN:
Nos próximos tempos, para além da contenção no sector público, Portugal vai necessitar de reduzir os seus custos de trabalho, o que pode passar por maior flexibilização laboral e uma reforma do sistema de Segurança Social. Vamos precisar de profundas reformas estruturais em áreas com a Educação e a Justiça. Teremos de baixar os custos da burocracia. Será natural ter de repensar o sistema de subsídios.
Muitos outros aspectos terão de fazer parte dos programas reformistas (e a eles voltarei mais tarde) mas hoje pretendo analisar as necessárias condições políticas. Portugal tem, actualmente, três partidos com vocação de Governo. Terão de ser eles a assumir, de forma duradoura e em conjunto, o caderno de encargos. Para isso é necessário que com recato se entendam sobre um conjunto de linhas gerais.
Ora aqui está a medida de transparência política preferida pela direita. “Com recato”, diz o Feio.
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Alberto Castro, no JN:
Acabar com os ricos não resolve nenhum problema. Aos ricos exija-se mais investimento que induza crescimento e mais empregos. Sem uma base económica sólida não conseguiremos resolver os problemas sociais. Sem uma economia competitiva não será possível aumentar, consistentemente, os salários e o nível de vida. Esse é ciclo natural das coisas: a riqueza e o rendimento não se inventam, criam-se. O "como" poderia ser uma boa plataforma de convergência entre trabalhadores e patrões. O resto é quase só fumaça.
Repare-se na distribuição “perfeita” de “funções”: Aos ricos, o investimento, o crescimento, a criação de emprego; aos pobres, a procura, quando há e onde há, de salário e nível de vida, ou então ficarem-se pela “fumaça”. É esta repartição hierarquizada de “funções”, no conceito ideológico que lhe subjaz, e só esta, que alimenta a oratória dos defensores da “convergência entre trabalhadores e patrões”. Ou seja, na continuação do jeito que seja como foi.
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Como na farmácia, aparece de tudo:
Criado ontem, segunda-feira, o grupo aberto "Eu digo 'Não' à greve geral de 24 de Novembro" tem por objectivo, diz o criador Nuno Pires, "juntar as pessoas que se opõem à realização da greve" e "despertar a reflexão sobre o tema". Porquê? A greve, diz o consultor de 28 anos, "deve ser o último recurso dos trabalhadores para a obtenção de melhores condições junto dos seus empregadores" e a maneira como esta foi organizada, pode ler-se no grupo, foi incorrecta. "Os sindicatos escusaram-se à negociação, rejeitaram o diálogo. Optaram, de imediato, por avançar para a greve", continua.
"Hoje em dia a greve parece ser o primeiro recurso dos trabalhadores, mesmo antes da via negocial", entende Nuno Pires. "Caso estas centrais estivessem, de facto, interessadas em defender os direitos dos trabalhadores, teriam aproveitado esta oportunidade para, através da negociação, diminuir alguns dos aspectos que irão afectar os trabalhadores que representam", explica.
Por isso mesmo, e "no momento que o país atravessa", "caracterizado por uma elevada pressão por parte dos mercados financeiros", a "imagem que é enviada ao exterior é altamente prejudicial", entende o consultor. Fazer uma greve agora, diz Nuno Pires, é "brincar com o fogo", pois a iniciativa vai apenas tornar-se "mais um factor de instabilidade", "que vai colocar Portugal ainda em pior posição face aos mercados internacionais". Uma paralisação nacional é, então, considerada "um atentado a Portugal e ao direito à greve".
Este foi o primeiro grupo criado por Nuno Pires. Escolheu o Facebook Groups pois entende que esta é, hoje em dia, "a via mais rápida de divulgar uma opinião, junto do maior número de pessoas possível". O grupo ainda não tem, no entanto, muita representatividade no Facebook, contando, para já, com 29 membros.
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Não tenho dúvidas: a greve geral de amanhã será o momento mais alto de cidadania colectiva dos últimos anos. Tem de ser, e será, tão forte que até os surdos políticos a vão ouvir.
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O presidente do conselho de administração da Sonae, Belmiro de Azevedo, manifestou hoje, segunda-feira, preocupação quanto ao Estado do país, afirmando que "estamos mais pobres" e remetendo uma posição sobre o Orçamento do Estado para depois da sua aprovação, na sexta-feira.
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Otelo, ontem, em entrevista ao DN:
- Neste momento, precisávamos de um governo de salvação nacional?
- Julgo que era fundamental. Se houvesse o milagre de os partidos, em conjunto, encontrarem um governo de salvação nacional que agarrasse o País...
- Mas como é que isso é possível com o tal quadro político que tanto desvaloriza e critica?
- É por isso que eu falo em milagre! Se houvesse um milagre que levasse os partidos a abdicar dos interesses partidários, e pensar na salvação do País.
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A Associação para a Recuperação da Memória Histórica aproveitou a efeméride para enviar uma carta ao primeiro-ministro, José Luis Zapatero, perguntando "por quanto tempo mais" deverão as vítimas do regime de Franco continuar a pagar com os seus impostos o Vale dos Caídos, "túmulo do ditador responsável por assassinar dezenas de milhares de civis."
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Nos ecos e protestos sobre a cimeira da NATO, tem-se subestimado o impacto social das medidas programadas de reestruturação da Aliança, cujos efeitos incontornáveis passam pela redução de pontos de comando, serviço e de apoio, bem como a redução significativa de postos de trabalho (muitos milhares de militares e civis vão perder os seus empregos), com distribuição do mal pelos vários países membros, incluindo, claro, em Portugal. Estas medidas foram sobretudo pressionadas pelo governo conservador britânico (que procedeu, no seu país, a uma fortíssima redução de efectivos militares e civis que trabalhavam na defesa) mas rapidamente forma aceites por todos os membros, até porque mal parecia o contrário e tendo em vista os apertos orçamentais a que todos os países sujeitam as suas contas nacionais. É uma lástima que esta componente social da problemática NATO, este contributo abominável para o aumento do desemprego, não conste com a ênfase merecida dos discursos e interpelações dos adversários da cimeira, em que estão arroladas centenas de sindicatos (leia-se a lista das organizações que fazem parte da plataforma Paz sim / Nato não).
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Obama lembrar-se-ia de referir a "nacionalidade" do seu cão, na fase de cumprimentos protocolares a anteceder uma qualquer reunião de Estados que se realizasse em Berlim, se este fosse um “pastor alemão”?
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Manuel António Pina, no JN:
Com o cair da folha e o início do ano lectivo, começam a ver-se por aí, onde existam universidades e aparentados, os habituais espectáculos de bandos de imberbes caloiros apascentados por não menos imberbes "doutores" ministrando-lhes todo o tipo de boçalidades e indignidades que a rasca imaginação lhes permite, com o devido enquadramento de bebedeiras, comas alcoólicos e música pimba que ilustram o nível moral e intelectual não só dos futuros caixas de supermercado da Nação mas igualmente das escolas que os formam.
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Simplesmente miserável, incluindo o recurso ao machismo rasca, um texto (siga-se o link para ler a versão integral) publicado no “Avante” sobre a política birmanesa e Nobel da Paz Aung San Suu Kyi, da autoria de Correia da Fonseca e que arranca assim:
A televisão trouxe a notícia da libertação de Aung San Suu Kyi, e é claro que fiquei satisfeito. Sou em princípio a favor de todas as libertações, mas talvez desta ainda mais do que é costume. Não por Suu Kyi ser Prémio Nobel da Paz e Prémio Sakarov: na verdade são galardões que pela sua própria história me inspiram alguma desconfiança e dispenso-me de explicar porquê. Mas acontece que Suu Kyi é mulher e que para mais tem aquele arzinho fisicamente frágil que nos dá cuidados quando a imaginamos presa. É certo que na sua própria residência, que é capaz de ser mais confortável que a minha. Mas imagino que deve ser terrível para uma mulher, para mais senhora de boa disponibilidade financeira, não poder sair de casa para ir às compras no hipermercado mais próximo. Não sei, é claro, se há algum hipermercado nas proximidades da residência de Aung San Suu Kyi, mas é praticamente certo que o haverá em tempo próximo, quando a democracia por ela desejada chegar enfim a Mianmar, pois é também para isso, para a abundante instalação de hipermercados, que a democracia serve, também para isso foi reinventada.
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