Aprende-se aqui: “La españolidad de Ceuta y Melilla está perfectamente probada”. E no benemérito intuito de “iluminemos a los ignorantes y desenmascaremos a los manipuladores” (uma frase que soa a slogan do dogmatismo maoísta do princípio da década de 70 do século XX), fica-se a saber que Ceuta (que era “portuguesa” antes da anexação de Portugal por Espanha no final do século XVI) com a restauração da independência portuguesa em 1640, passou a eternamente espanhola por meio de eleições livres e democráticas (típicas das que se praticavam nos reinos do século XVII) e que Melilla a Espanha pertence e pertencerá porque, estando destruída e abandonada, foi tomada por espanhóis em 1497 (assim dispensando futuras eleições, presume-se). Resta perguntar ao ilustre hispano-historiador o que aconteceria à Europa e ao mundo se as legitimações das identidades nacionais da actualidade se baseassem na regressão aos direitos de conquista do século XV e às escolhas “referendárias” do século XVII. E tardaria nada estaríamos a desconversar à volta da “vaca fria” de Olivença. Ou seja, a perder tempo a olhar para trás. O melhor, então, é ficarmos por aqui: “onde Rei mete pé, a terra à coroa pertence”. Vale!
Ver ao longe, avistando costas do Mediterrâneo e do Adriático, é virtude. Ver ao perto é, no mínimo, conveniente.
Estas lágrimas salgadas sobre o nomadismo proprietário do L’Unitá:
A política italiana não pára de me surpreender.
Agora surge a notícia da venda iminente do histórico L'Unitá a uma "holding" financeira, a Tosinveste, da família romana Angelucci.
É como se o Avante fosse vendido ao Joe Berardo.
Fundado por Antonio Gramsci, que deve estar às voltas no túmulo, foi o orgão oficial do PCI, nos bons velhos tempos, e depois apoiou o PDS e o DS.
Deve ter acabado por se baralhar com tanta sigla e tanto oportunismo.
em que choro de maresia brava não daria se vertida, em indignação doméstica, sobre o fim de “o diário”, o fechar de portas da CDL e o trespasse da Editora Caminho a favor da mãos de Miguel Paes do Amaral, um tubarão emergente do mercado livreiro lusitano?
Haja óculos para nariz que se queira coerente.
Em Hollywood, os guionistas fazem greve à escrita. Já não era sem tempo que quem escreve desse forma e conteúdo à luta. E “strike” sempre foi palavra com força de nervo. Apoiado, aceno eu daqui.
Se conversaram sobre o papel das mulheres na sociedade, então o consenso deve ter sido imediato. Não admira, eles são cara e coroa dos feudalismos deste tempo. Por isso mesmo, o encontro de Bento e Abdulá só podia ser histórico.
Se Ceuta e Melilla, últimos resquícios de um império colonial caducado, são os refúgios em adornos de pedras preciosas numa coroa, então é porque esse Rei, o que foi coroado “pela graça de Franco”, agora agarrando-se a tais enfeites historicamente enferrujados, está a cavar o regresso à
cravando o último prego no caixão do seu tutor, esse sarcófago do ditador-vampiro por obra do nazi-fascismo, ainda depositado no Vale dos Caídos. E sobre o qual paira a ameaça penada de nunca nele secar o muito sangue acumulado na vingança sobre os fuzilados e oprimidos que deram a vida e a honra pela República e pela Democracia em Espanha.
Este post do Nuno Guerreiro (a quem aproveito para felicitar pelo 4º aniversário do seu excelente blogue) é uma exemplificação extremada do estado a que chegou o “socialismo dos tolos” (Augusto Bebel dixit) dos nossos dias. E que demonstra a persistência da paranóia própria dos eternos adeptos da resolução única dos problemas sociais e políticos pela via da insurreição com a companhia indispensada do terror (que, sabe-se pela história, começa como complemento e termina sempre como objecto quase principal). Porque um extremista desarmado do ímpeto paranóico será sempre olhado pelos mais consequentes entre os seus como um débil e não tardará a entrar no lote dos que se movem em contra mão. Com as célebres condições objectivas e subjectivas reunidas, as que levam ao poder consistente, logo absoluto (e, superada a fase da hegemonia, ele tende sempre para o absoluto, forma única de construção do projecto comunista), o terror, a aniquilação dos opositores e dos hesitantes ou pouco zelosos, torna-se em forma normal de exercício de poder de supremacia e de neutralização. A imensa fortaleza policial, onde a espiral do aparelho repressivo nunca parou de crescer até se tornar em essência da política de Estado, em que o comunismo mundial se transformou nos imensos espaços (geográficos, sociais, políticos) que ocupou, é a melhor prova de como o terror, pela sua natureza intrinsecamente paranóica, possui uma capacidade de degeneração constante. Reprimindo por método e sistema, o poder comunista, incorporando o terror como seiva de luta e dinâmica, após se esgotar a coleccionar esqueletos de corpos e pensamentos, envereda por aprisionar o ar que se respira e é então que, como aconteceu nos domínios soviéticos, arrisca a morte por falta de ar.
Entre os escombros da implosão soviética, para além das sobras (os manicómios políticos de Cuba e Coreia do Norte, mais os conversos ao “capitalismo comunista” da China e Vietname), restaram imensos órfãos do irredentismo revolucionário espalhados mundo fora (os que contestam a democracia na impunidade fornecida pela falta de uso do terror pelos regimes democráticos). A que se juntou, como nova vaga, o caudilhismo populista que sempre encontrou terreno fértil na América Latina. E que agora com Chavez (melhor, com os petrodólares de Chavez), para mais com o preço do barril do petróleo em permanente subida, encontra mesa farta para alimentar a base material do contra-ataque anti-imperialista, o da desforra da queda do império soviético e contra o domínio monopolar dos Estados Unidos, o eterno império do mal. Mas tudo isto junto e cimentado (mal, porque o sincretismo entre paranóias conflituais é difícil ou impossível) é pouco e curto. Tanto que “outros”, de outra escola de fanatismo paranóico, os fundamentalistas islâmicos, se têm mostrado mais “eficazes” a ameaçar e a atacar o “campo imperialista”. A marcha da crescente aliança entre os órfãos do marxismo-leninismo, os democratas que odeiam a democracia e os fanáticos islâmicos só pode impressionar quem persistir em encontrar uma linha lógica no encontro de paranóias várias mas confluentes (na do “inimigo comum”).
O episódio caricato, quase de um ridículo absurdo, apresentado pelo Nuno Guerreiro no seu post, é a face paranóica de um encontro de ódios em que, pelo primado do ódio, os projectos ficam metidos nas gavetas de cada um. Se a saga dos filhos do “Che” em terras do Irão impelem ao riso, é bom que por aí não se fique. É que o cimento que une aquela gente é a disponibilidade e apetência pelo terror. E o sincretismo tentado para rituais afiados tem como parceiros gente bem perigosa.
Foi como visitar uma relíquia cinéfila, o reencontro com Jacques Tati anteontem em tele-serão (coisa que me é rara). Com um filme que é uma autêntica colheita de reserva que o tempo requinta sem criar depósito. O humor do insólito mais absurdo e mais genial retratando, no pós-guerra, a resistência ronceira da França saída de Vichy ao empurrão frenético do “time is money” alavancado pelo reerguer interessado do Plano Marshall e que, pesados todos os prós e contras, foi o responsável primeiro de, na Europa não pisada pelas botas do Exército Vermelho, se ter verificado a desnazificação sem queda na antípoda sua gémea. Permitindo, exemplo maior, o génio de Tati, um preço sem direito a regateio. Ainda embalado nesta fruição de dimensão caseira, constato que algures, lá no centro, tive companhia cinéfila para o mesmo ritual de culto. O que significa que, sem se sair de casa, se pode ir ao bom cinema e bem acompanhado.
Este companheiro individualista, apesar e por causa do seu admirável texto céptico, não dando mostras de ter ficado impressionado com 200.000 operários a desfilarem no Parque das Nações (quem sabe se, por heresia, achou que a maioria eram reformados ou empregados públicos) já deve constar da lista negra do Miguel do post anterior:
Cresci na ilusão democrática. Embora nos contássemos pelos dedos de uma mão, isso era uma circunstância. As massas populares, que tinham escrito a história, desde a Roma de Spartacus até à recente Cuba dos guerrilheiros românticos, irromperiam em cena também neste país. Viriam de barco, desaguando no Rossio, como previa o poeta no seu primeiro livro. Seríamos muitos, nesse dia limpo, nessa madrugada clara. Quando comecei a pensar, o que aconteceu tarde como os que acompanham estes posts já sabem, percebi que não tinha confiança nenhuma nas massas populares. Os verdadeiros proletários desiludiam. Diziam-me: são o lumpenproletariado. Entre mim e os camponeses houve sempre, injustamente, os gritos do porco na matança, a cacetada no coelho, a degola das aves ou a textura do diospiro. Já com os intelectuais as coisas eram mais fáceis. Não com os artistas. Gosto do produto da actividade dos artistas mas assusta-me o desequilíbrio, a precaridade, o experimentalismo e o sexo em grupo. Professores, só universitários, da espécie em licença sabática permanente. Com os outros confesso ter pouca empatia: horários de vinte e sete horas semanais, problemas de disciplina, depressão na Páscoa, pneumonites ao giz, colocação no quadro de zona pedagógica. Não resisto a tamanha miséria. Gosto dos artífices e artesãos: carpinteiros, estofadores, canteiros, ferreiros. Mas parecem estar em extinção. Também gosto das floristas, das que nunca cheguei a conhecer: a da Estrada de Benfica, a florista de Mangualde. Acontece que todos estes grupos, que enumero, já não têm sindicato, associação só liquidatária. Aproximei-me demasiado dos especialistas em arte conceptual, dos psicólogos evolucionistas, dos neurocientistas, dos geólogos que estudaram a última glaciação. Por um motivo ou outro fui rejeitado.
Miguel Urbano Rodrigues, o companheiro das FARC que foi director do falido “diário da verdade a que temos direito”, hoje transformado em pirotécnico da ala mais esquerdista do PCP, embandeirou em delírio com a manifestação de 18 de Outubro e já antevê (só “faltam as condições subjectivas”…) o regime a desmoronar-se por acção das massas em fúria (conduzidas pela “vanguarda revolucionária organizada”, o PCP), contra “uma politica em que despontam já matizes neofascistas”:
Esta manifestação repetiu outras anteriores, superando-as pela participação, pela consciência da gravidade da crise revelada pelos trabalhadores, e sobretudo pela percepção de que os grandes protestos populares somente desembocam numa confrontação frontal com o Poder quando se inserem numa estratégia cuja vitória pode desembocar numa mudança de regime.
Na sociedade portuguesa estão criadas condições objectivas para inviabilizar a permanência deste governo. Faltam as subjectivas.
Convêm não esquecer que algumas das revoluções que mudaram o rumo da história principiaram com manifestações de protesto que, ao repetirem-se e ao evoluírem para o choque permanente das massas com o Poder, minando-lhe a base social de sustentação, o impediram de impor a sua vontade.
Os trabalhadores e a CGTP cumpriram exemplarmente o seu dever na jornada do dia 18. Nestes dias em que a burguesia insiste no desaparecimento da luta de classes, a classe operária portuguesa ofereceu-lhe um desmentido categórico no Parque das Nações.
Em Portugal existe um forte partido marxista-leninista com um programa que aponta o socialismo como objectivo. É outro factor positivo porque sem vanguarda revolucionária organizada, a classe dominante não será derrotada por acções espontaneistas, por mais participadas que sejam.
Estamos longe, muito longe de uma dualidade de poderes. Mas os de cima não vão poder por muito tempo governar como querem.
O governo desta ditadura socratiana da burguesia, com máscara democrática, está progressivamente a desenvolver, na dialéctica do processo, uma política em que despontam já matizes neofascistas.
O povo português – repito – está em condições de se assumir em sujeito, como aconteceu em grandes momentos da sua história, e de travar a escalada reaccionária, derrotando o projecto monstruoso em desenvolvimento.
Pelo que escreve, o sujeito já deve ter preparado, no quadro das condições objectivas, uma espécie de imaginada NKVD para tratar do juízo e da saúde aos “neofascistas” e quem mais se oponha à “estratégia cuja vitória pode desembocar numa mudança de regime” que aproxime a “dualidade de poderes” da pré-insurreição. Se este Miguel tivesse um mililitro de tino, então é porque se aproximava a hora de se fugir. Sendo só, como parece ser, um caso de senilidade marxista-leninista, aguentemos porque o delírio não dura sempre.
O Zé Paulo deu-me instruções para transcrever a 5ª linha da página 161 do livro que tivesse mais à mão. Aqui vai:
“o sul era o «chão» dos balantas e ninguém melhor do que eles conhecia as zonas em que os confrontos se desenrolavam”
(De “O Fazedor de Utopias, uma biografia de Amílcar Cabral”, António Tomás, edições Tinta da China)
E passo a “corrente” para António Godinho Gil, Manuel Correia, Daniel, Marcelo Ribeiro e Carlos Freitas. Uff, já está.
Pareceu-me, há pouco, ouvir o som estaladiço de mais uma folha seca a cair. O melhor é fazer de conta que não.
Nick Cohen, autor de “O que Resta da Esquerda?”, agora editado em Portugal, em entrevista a Teresa de Sousa:
(…) as pessoas que são vítimas de movimentos extremistas e de regimes ditatoriais cujos actos não podem ser atribuídos à responsabilidade dos americanos passam a ter muito pouco apoio. Por exemplo, as feministas iranianas, os palestinianos secularistas, os sindicalistas chineses. É só quando o sofrimento das pessoas pode ser atribuído à América, ou ao Ocidente em geral, só nessas condições é que merece solidariedade.
(…)
Quando se passa a vida, tendo ou não razão, a denunciar a nossa própria sociedade e os seus abusos, fica-se quase sem defesa para compreender como o totalitarismo é mil vezes pior. Dizia-se: "O Hitler é um nazi mas o Churchill é um fascista." Hoje vimos este tipo de raciocínio todos os dias. "OK, os taliban e a Al Qaeda são horríveis, mas os Abu Ghraib, os Guantánamo são a mesma coisa."
OS MEUS BLOGS ANTERIORES:
Bota Acima (no blogger.br) (Setembro 2003 / Fevereiro 2004) - já web-apagado pelo servidor.
Bota Acima (Fevereiro 2004 a Novembro 2004)
Água Lisa 1 (Setembro 2004 a Fevereiro 2005)
Água Lisa 2 (Fevereiro 2005 a Junho 2005)
Água Lisa 3 (Junho 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 4 (Outubro 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 5 (Dezembro 2005 a Março 2006)