Quarta-feira, 2 de Agosto de 2006

FOI DO STRESS, NÃO FOI?

000ap3wb

Aqui me confesso, falando do que, sentindo, sei.

 

Imagem: Em Cacine, Sul da Guiné-Bissau, Maio de 1970, a meio da comissão na guerra colonial. Faltavam três meses para a Catarina nascer.

Publicado por João Tunes às 18:00
Link do post | Comentar | Ver comentários (1)

RECORDAÇÕES, QUEM AS NÃO QUER?

000ak0rw

Falta um mês para a “Festa do Avante”. Vai uma aposta que, passadas que foram as modas das “matrioskas”, dos “lenços à Arafat” e das t-shirts do Che, este ano, o pechibeque mais procurado para ficar como “recordação” vai ser uma miniatura em plástico (para não aleijar as crianças), do género dos martelinhos do São João no Porto, de um “rocket” do Hezbollah? Ou, mas só para os mais militantes, uma “katiuska” de imitação fabricada na China.

 

Ali, a solidariedade internacionalista nunca falece. E os “rockets” do Hezbollah ou nunca acertam ou não fazem vítimas civis, muito menos mulheres, velhos e crianças. São armas politicamente selectivas contra o imperialismo e o sionismo. Quando muito, acertam num ou outro soldado israelita, mas nisso, judeu a mais, judeu a menos…

Publicado por João Tunes às 17:20
Link do post | Comentar | Ver comentários (1)

O PESO ACORDADO DA MEMÓRIA

000ahr1t

A memória pesa. Pesando, resiste a adormecer no esquecimento. E dói se deitada sobre almofadas de tabu. Porque, se recalcada, não há morfina que iniba o efeito maldoso do pesadelo da memória. E, se obrigada a dormir à força, quantas são as vezes em que a memória nos acorda e espanta com o seu ressonar…

 

Por cá, andamos às voltas com os sítios da tortura e ignomínia pidesco-salazarista para ver se se arranja um sítio condizente para se deitar a memória, sem a esquecer, do meio século português em que a prisão e a tortura ocuparam o lugar da liberdade. Parece que não pode ser na antiga sede da “prestimosa” onde se davam os “safanões a tempo”, agora destinada a servir de tugúrio de luxo a ilustrar o Chiado. Para ali estarão destinadas camas finas e de bom sossego, não para se deitar, ou sequer sentar, a malfadada memória que tem o risco de perturbar a direita portuguesa de hoje, recordando-lhe, num qualquer propósito despropositado, que receberam uma herança de vergonha dos seus ascendentes trogloditas. A coisa estará encaminhada para que a memória da ditadura se sente e se exponha, pelo menos com algumas das suas partes, no Aljube em Lisboa e na sucursal da PIDE na Rua do Heroísmo, no Porto. Já é qualquer coisa entre tanta desmemoria conseguida.

 

Ao nosso lado, o governo Zapatero, finalmente e no 70º aniversário da mortandade iniciada com o golpe de Franco, aprovou uma lei que contempla alguma reparação de injustiças longas e fundas pela forma como se incensaram os vencedores e se aviltaram os vencidos. Agora, já se podem recolher as ossadas dos fuzilados despejados em valas comuns, vão ser retirados os vómitos toponímicos da exaltação franquista e que poluem praças, avenidas e ruas de Espanha, o “Vale dos Caídos” (em Gadarrama às portas de Madrid) vai ser “reconvertido” da sua parcialidade, passando de monumento católico-fascista de exaltação ao “Caudillo de Espanha pela graça de Deus” a memorial de respeito por todas as vítimas da guerra civil de Espanha e da ditadura de Franco. Nada mau, nada pouco. Claro que esta medida, corajosa mas aquém de tudo quanto seria justo, despertou sentimentos adversos. A extrema-esquerda queria mais. A direita e extrema-direita (que, em Espanha, se misturam num mesmo Partido) queria nada. Ou seja, queriam a continuação do silêncio. Porque as suas vítimas não estão insepultas e deram-se prebendas a eles ou seus descendentes, porque gostarão de passear e “tomar una copa” em “calles” evocando Franco, José António e seus émulos, finalmente porque sabem que a recuperação da memória lhes mostra os rabos de palha com que, hoje, participam no jogo democrático que, quando do poder absoluto, sempre negaram a outros. Enfim, entre os dois termos na desforra ou no prolongamento do “esquecimento”, Zapatero (filho de um fuzilado por Franco), mais uma vez, talvez sábia e sensatamente, escolheu traçar uma lei de risco a meio (mas honroso e corajoso).

 

Olhando para a manifestação da “opinião pública” portuguesa, tirando uns tantos que resistem aos malefícios da amnésia colectiva, ou assistimos aos silêncios da ignorância ou da conveniência, ou então encontramos ecos do inconformismo com o despertar da memória. Vasco Pulido Valente, cada vez mais competindo com o estatuto de inimputabilidade de “enfant terrible” já outorgado ao Jardim da Madeira, vocifera que transformar a memória dos tempos do salazarismo em Museu é parvoíce (tirando ele, poucos serão os não parvos). Mário Pinto, professor e colunista no “Público”, genuíno representante da eterna direita católica, silencia (diplomaticamente?) o que por cá se reclama e pré-anuncia, para zurzir nos “malefícios” de Zapatero em mexer na memória da guerra civil, reproduzindo integralmente a mentira de propaganda das hostes católico-franquistas – “foram os rojos, com os seus abusos, que provocaram a guerra em Espanha” (sua última crónica no “Público” da passada segunda-feira). Ou seja, setenta anos passados, nada aprendeu nem quis aprender e muito menos aposta no remorso, confissão e penitência, pela forma como a Igreja Católica apoiou e sustentou a mortandade espanhola e os crimes do franquismo. Talvez tenha hábito, sustentado por décadas, de rezar na missa diária celebrada no “Vale dos Caídos” pela vitória do franquismo e glória celestial dos seus combatentes e, agora, lhe custe a reconversão da Basílica ímpia. Talvez. Que aproveite, ele e outros mais, as missas celebradas por dominicanos a separar os "santos" dos "pecadores" e antes que as obras comecem.

Publicado por João Tunes às 16:13
Link do post | Comentar

O PAPEL DO “MAU LADRÃO”

000ag764

Na sua exposição redentora (libertador de Cuba, desafiador dos Estados Unidos, apoiante dos povos oprimidos de todo o mundo), Fidel Castro sempre se fez acompanhar, na cruz da “Pátria ou Morte, Venceremos”, das representações repescadas do “bom ladrão” e do “mau ladrão”. Tal como Cristo que, segundo alguns, terá sido o primeiro revolucionário comunista na terra. O papel de primeiro acólito, o “bom ladrão”, o romântico idealista, foi representado com sucesso pela saga e depois mito do Che. O papel de segundo acólito, o “mau ladrão”, o da mão dura, ortodoxa e impiedosa, foi desde sempre entregue ao seu irmão mais novo Raul. E emoldurado entre o mito de Che e a mão de aço de Raul, Fidel tem reinado absolutamente há 47 (quarenta e sete!) anos.

 

Numa extensa e detalhada carta pública (transcrita, deu para encher toda a primeira página do “Granma”), Fidel fez a transferência (provisória) dos seus vastos poderes omnipotentes. A carta em si mesma não tem qualquer credibilidade. Ou a doença do ditador não é tão grave como proclamou ou um paciente com doença tão grave, a caminho da mesa de operações e com abundantes hemorragias internas, não tem capacidade para pensar e muito menos escrever uma tão longa e minuciosa carta, pelo que outros a terão escrito em seu nome. Daí que julgue com consistência a tese de Martín Iñiguez Ramos (professor de relações internacionais na Universidade Nacional Autónoma do México) em entrevista à Agencia mexicana NOTIMEX em que vislumbra uma mera encenação de antecipação da passagem dos poderes. O que não espantaria em Fidel, antes demonstraria que aos seus dotes de actor carismático, junta os de encenador prevenido e de talento manhoso. Quiçá, contando que a “provocação” (de que as manifestações de júbilo feitas em Miami são o primeiro resultado) faça saltar antes de tempo, os opositores internos, os saturados, os sedentos de "desforra" e os “inimigos americanos”, inviabilizando as condições para uma saída pacífica e democratizante. E o “contragolpe” (o da “defesa da revolução”) já está em marcha com a mobilização militar de todos os cubanos com menos de 45 anos e dos CDR’s (as milícias de bairro).

 

Embora oficialíssima há muitos anos, até pelo aval constante dado por Fidel a essa linha de sucessão, nunca foi consistente a hipótese de que a Fidel lhe sucedesse o “mau ladrão”. Nem o facto de a “carta” de agora o parecer confirmar e oficializar. Há quase unanimidade na percepção que Raul Castro não tem a mínima capacidade de suceder a Fidel e que a verificar-se essa hipótese ela só se justificaria por paranóia aguda e/ou … para precipitar o fim da ditadura cubana. Raul é um duro, um político gelado e impiedoso, incapaz de representar o folclore do idealismo romântico, utópico e populista latino-americano e de criar empatia, sem o mínimo de carisma, constando-se que gosta mais de rum que de arengas às massas. É o frio torcionário da sombra, o suporte militarizado e carcerário do poder exercido pelo mano carismático. Não tem estofo de primeira figura. Assim, a hipótese de Raul a suceder a Fidel, só entra na hipótese absurda de Fidel, traindo a Revolução, resolver entregar a “taluda” aos Estados Unidos e à máfia cubana de Miami, devolvendo-lhe o bordel, o casino e as praias que conquistara a Batista. Uma hipótese tão louca que se suportaria apenas num diagnóstico errado do mal grave de Fidel – será demência o que padece e não dos intestinos.   

 

 

De qualquer forma, Fidel, embora a contragosto, não é eterno. Já o tem dito pelo que se presume que aceite esta lei da vida. Resta saber se os seus companheiros de poder a reconhecem. E talvez seja essa a estratégia de Fidel – experimentar-se o mando breve e desastrado do “mau ladrão”, esgotando-se aí as catarses emocionais, testando-se as reacções internas e externas, para que, ainda podendo intervir, o sucessor de facto (Carlos Lage Dávila ou, mais consistentemente, Felipe Pérez Roque), salte para a ribalta como factor de apaziguamento e de remobilização. Como sempre, os estertores das ditaduras são trágicos e caixas de surpresas. Porque nestas, ao contrário das democracias, as passagens de testemunho soam muito mais a contos policiais que a romances banais. O problema, para além da estética e rodriguinhos do espectáculo, é que os cubanos mereciam, como todos os povos, transição democrática, liberdade e tranquilidade, sem perda de soberania. O que, com Fidel, foi uma possibilidade negada e sabotada. Sem Fidel, ou além de Fidel, é apenas uma esperança improvável ao fundo do túnel. Deixando para a história cubana a marca de que a sua maior tragédia se chama, se chamará, Fidel Castro.

Publicado por João Tunes às 13:16
Link do post | Comentar

j.tunes@sapo.pt


. 4 seguidores

Pesquisar neste blog

Maio 2015

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab
1
2
3
4
5
6
7
8
9
10
11
12
13
14
15
16
17
18
19
20
21
22
23
24
25
26
27
28
29
30
31

Posts recentes

Nas cavernas da arqueolog...

O eterno Rossellini.

Um esforço desamparado

Pelas entranhas pútridas ...

O hino

Sartre & Beauvoir, Beauvo...

Os últimos anos de Sartre...

Muito talento em obra pós...

Feminismo e livros

Viajando pela agonia do c...

Arquivos

Maio 2015

Março 2015

Fevereiro 2015

Janeiro 2015

Dezembro 2014

Novembro 2014

Outubro 2014

Setembro 2014

Agosto 2014

Julho 2014

Junho 2014

Maio 2014

Abril 2014

Março 2014

Janeiro 2014

Dezembro 2013

Novembro 2013

Outubro 2013

Junho 2013

Março 2013

Dezembro 2012

Novembro 2012

Outubro 2012

Setembro 2012

Agosto 2012

Junho 2012

Maio 2012

Março 2012

Fevereiro 2012

Dezembro 2011

Novembro 2011

Outubro 2011

Setembro 2011

Agosto 2011

Julho 2011

Junho 2011

Maio 2011

Abril 2011

Março 2011

Fevereiro 2011

Janeiro 2011

Dezembro 2010

Novembro 2010

Outubro 2010

Setembro 2010

Agosto 2010

Julho 2010

Junho 2010

Maio 2010

Abril 2010

Março 2010

Fevereiro 2010

Janeiro 2010

Dezembro 2009

Novembro 2009

Outubro 2009

Setembro 2009

Agosto 2009

Julho 2009

Junho 2009

Maio 2009

Abril 2009

Março 2009

Fevereiro 2009

Janeiro 2009

Dezembro 2008

Novembro 2008

Outubro 2008

Setembro 2008

Agosto 2008

Julho 2008

Junho 2008

Maio 2008

Abril 2008

Março 2008

Fevereiro 2008

Janeiro 2008

Dezembro 2007

Novembro 2007

Outubro 2007

Setembro 2007

Agosto 2007

Julho 2007

Junho 2007

Maio 2007

Abril 2007

Março 2007

Fevereiro 2007

Janeiro 2007

Dezembro 2006

Novembro 2006

Outubro 2006

Setembro 2006

Agosto 2006

Julho 2006

Junho 2006

Maio 2006

Abril 2006

Março 2006

Fevereiro 2006

Janeiro 2006

Dezembro 2005

Novembro 2005

Outubro 2005

Setembro 2005

Agosto 2005

Julho 2005

Junho 2005

Maio 2005

Abril 2005

Março 2005

Fevereiro 2005

Janeiro 2005

Dezembro 2004

Novembro 2004

Outubro 2004

Setembro 2004

Agosto 2004

Julho 2004

Junho 2004

Maio 2004

Abril 2004

Março 2004

Fevereiro 2004

Links:

blogs SAPO