Deixo-vos, aos que ainda não zarparam, entretidos a governarem o Norte. Cuidem bem dele e, depois, contem-me como vai, como vamos, como continuamos. Tudo com pormenores e considerandos, sem falharem nas conclusões, detalhadas se possível. E é claro, também sem sovinice em gráficos e indicadores a rechearem os anexos que se querem abundantes como é apanágio do nosso Norte rico, mais em gordura que em solidariedade. Sem falha do competente resumo que não deve ultrapassar uma folha A4 pois pressinto que voltarei cheio de preguiça, daquela boa, gostosa, farta, a preguiça do Norte.
A qualidade faustosa de ser do Norte permite-me rumar ao Sul. Esse Sul que tanto me puxa pelos pés, apesar da vergonha que não me falta ao olhá-lo e pisar-lhe os caminhos. Tarda nada vou voltar a enterrar os pés nas terras e areias da “morabeza” numa semana programada para “crioular”. Em “hora di bai”, desejo que passem todos muito bem. Tarda nada, aqui estarei a testar as paciências dos mais pacientes. Até breve, em reencontro no Norte. Talvez nem tanto se a internet conseguir ligar Sul a Norte (valha-nos, se valer, essa "igualdade global" e ... tão virtual).
Sei lá fazer o quê. Mas como se libertou da canseira do MNE, talvez agora esteja disponível para ser porta-voz dos “SMS” a enviar por Ana Gomes ao Presidente Xanana.
Imaginemos então. Por exemplo: imitando o que consegue fazer a democracia dos imperialistas, o Supremo Tribunal de Cuba se decide pela obrigação de Fidel Castro libertar as dezenas de jornalistas e outros cidadãos cubanos enfiados em masmorras por pensarem e escreverem diferente do que pensa, discursa e decide o Coma Andante.
Mari Alkatiri, um dirigente democraticamente eleito mas deposto por um golpe de Estado, o político que, segundo “uma grande amiga do povo de Timor”, o «povo - por justas e injustas razões – odeia» (muitos referendos esta senhora deputada – a da “quota feminista” - deve fazer pela socapa sem que nós e os timorenses disso se apercebam), o homem que caiu em desgraça quando tentou colocar, nos negócios do petróleo, os interesses de Timor acima dos interesses da Austrália, da Indonésia e de Portugal (lembram-se das vozes que gritaram “ingratidão” quando a Galp não venceu o primeiro concurso de concessão de exploração?), acrescido ao crime gravíssimo de professar religião diferente numa parte de ilha que o Vaticano pretende que seja fortaleza católica num arquipélago islâmico, demonstrou que, pesem embora pecados e erros possíveis e mais que prováveis, foi e é o único político timorense visível com sentido de dignidade de Estado, capaz da humildade de abdicar para que o mal maior, a guerra civil, não queime o que ainda sobra de Timor Leste.
Xanana, o balhelhas prisioneiro político da esposa australiana; Ramos Horta, o cínico maior do oportunismo todo-o-terreno; os bispos e padrecas da cruzada das sotainas nos mares das Índias Orientais; a deputada intervencionista incapaz de conter os excessos verbais a mandar “SMS” no uso de um telemóvel incontinente; Cavaco Silva, o que reiteradamente ofende uma nação soberana ao referir-se-lhe como “território”; Sócrates e António Costa, os cow-boys rápidos a puxarem pela GNR do cinturão do mando com tiques neo-coloniais; todos podem ganhar, com a Indonésia ou com a Austrália; todos podem gabar-se de ter ajudado a deitar abaixo Mari Alkatiri e a Fretilin; todos podem gritar, ufanos, que ajudaram a que mandassem os interesses em vez da legitimidade e da força do voto; mas nunca chegarão aos calcanhares do Vencido, à bainha da sua dignidade. Da mesma forma que a memória política de Kissinger merece toneladas do desprezo necessário para se poder honrar a memória de Allende. Continuam a haver homens grandes na forma como são derrotados ou se deixam derrotar. Honra, pois, a Mari Alkatiri. E que Timor o mereça. Se for sem ele (o que não são favas contadas, ó Dona Ana Gomes!), que dele se aproveite o exemplo.
Claro que se pode ser hiperpatriota no futebol, amar Scolari, pendurar bandeira no estendal da roupa, vibrar com os nossos feitos nos relvados germânicos e, ao mesmo tempo, manter impoluta a consciência social, até a política, não abrir mão dos pergaminhos nas exigências culturais, continuar a deitar cedo e a cedo erguer, ter à mão de semear as sapatilhas e a t-shirt para a próxima manif a desancar no Sócrates e a caricaturar o Bush, defender a homofilia e as quotas para as senhoras e para os pretos mais os amarelos, o enriquecimento civilizacional com a entrada da Turquia na União Europeia, gritar Azambuja sim e Saragoça não, ou até apelar a que uma boa alma que possa mande o Pacheco Pereira pentear macacos. Cada coisa no seu galho. Concordo.
Só não concordo que não se possa discordar. Que não se permita recusar o banho na onda. Esta onda com arremedos totalitários de nacionalismo bacoco e pimba, nivelado na cervejola e no cachecol. Este unanimismo místico-histérico em que, num rectângulo de relva, se pretende suprir a falta de projecto, de governo, de decência, de cidadania e de futuro. Sobretudo exigir isso a quem gosta de futebol, cegando-se por vitórias a evidência de uma equipa que não joga ponta de um corno, idolatrando-a, abraçando-a, perdoando-lhe a inépcia. É que se, quanto a exigência, dela se prescinde no futebol, depois, pela certa, vai faltar para o resto. E o resto somos nós. Todos - os festivos e não festivos. Juntos, outra vez, no pós-Mundial. Sem bandeiras. Sem Scolari.
A “deputada, cidadã portuguesa e amiga de Timor” Ana Gomes, através de um “SMS” resolveu, de uma penada telemóvel, a crise
Ambas as ordens foram rapidamente cumpridas. O que faz a autoridade do currículo e a tecnologia de um telemóvel! E, pelo sabido, uma irritação de Ana Gomes risca mais em Timor que trinta batalhões da GNR (o que se podia ter poupado em despesas de envio, material e extras remuneratórios…).
Eu gostava era de saber como é que a “deputada e cidadã portuguesa” reagiria se “um deputado timorense, cidadão timorense e amigo de Portugal” mandasse um “SMS”, depois tornado público, para o Presidente Cavaco a exigir a demissão de Sócrates por causa da crise com os professores e os agricultores. Ui, o que se diria de tal desaforo. Pois é, Timor, como insiste Cavaco em categorizar aquele país, é apenas um “território”. Quanto a nós por cá, somos uma velha nação e já várias vezes derrotámos os “piratas holandeses”. Em África, no Brasil e até na Alemanha. Valem os pergaminhos de grande potência – nos “SMS” ou no futebol.
Com um saco bem cheio de sorte e uma mão encorpada para semear energia vital, até da sede e da fome da terra se pode colher um alqueire bem medido de paz. Pelo menos, a paz da esperança fundada em que os apetites desmedidos da terra se aquietam. É o caso. Demonstrando que a terra, se bem lavrada, pode trocar o pecado da gula por gente pela sede de água. E dessa vou já encharcá-la. Depois, bem bêbada, pode ser que se entretenha com as árvores que, essas sim, são suas filhas legítimas.
Bom fim-de-semana para vocês. E obrigado aos que tiveram a simpatia de mandarem, pelo correio do vento da esperança, palavras de amizade.
No mesmo barco golpista, um Bispo e o Primeiro Ministro da Austrália, mais uma autointitulada Amiga do povo de Timor Leste(*) e outros que tais.
A ditadura castrista, talvez cansada de mandar para a prisão os discordantes e os jornalistas, resolveu variar a ementa repressiva. Quiçá como prova de pluralismo presidiário, os dirigentes cubanos decidiram inaugurar uma nova etapa e prenderem-se uns aos outros. Juan Carlos Robinsón Agramonte, até há pouco figura grada da Comissão Política do Partido Comunista Cubano e que havia combatido em Angola em apoio do MPLA, foi condenado a 12 anos de prisão sob a acusação de “tráfico continuado de influências” (a “nota oficial” pode ser lida aqui). O ex-dirigente cubano agora condenado era um dos pouquíssimos dirigentes partidários e do Estado com pele negra. Sabendo-se que os negros em Cuba constituem a maioria da população prisional e têm preferência nas interpelações policiais, a medida, além do mais, acrescenta coerência à distribuição racial estratificada na sociedade cubana.
Deixo a eloquência opinativa sobre a situação actual
Manda a isenção que se diga que Cavaco, ao dizer a parvoíce que disse, repetiu o que Jorge Sampaio havia dito quando do Euro 2004. E Sampaio não era parvo. Falava era demais e dizia de menos. E isso quando dizia alguma coisa. O que raramente aconteceu. Já Cavaco não tem fama, nem mérito, de orador compulsivo e gongórico. Tem até fama de “fazedor” e de “terra a terra”, fala com a boca cheia de comida, tem mais cultura de empreiteiro de obras e de contabilista que o verniz bem acabado do Sampaio melómano, com traquejos de alta advocacia e de jogador de golf, no seu estilo de “british” enfastiado com tiques maníacos pela oratória redonda. Nem sequer a Maria Cavaco tem a mesma compostura da elegância hirta e longa da Dona Zé.
Então, o que terá levado Cavaco a imitar agora Sampaio? Avanço duas hipóteses concomitantes – Cavaco dá-se melhor com o PS (este, o de Sócrates) que Sampaio e quer ajudá-lo a puxar a carroça do “Centrão”; o irresistível “efeito Scolari”.
A primeira hipótese nem sequer necessita de demonstração. Quanto a Scolari, mestre em populismo, mais mestre nisso que em artes de futebol, ele teve a alta visão estratégica de estudar e afunilar os piores dos defeitos portugueses e a forma de nos explorar o sentimentalismo fadista-fatimista e os nossos apetites pelas vãs glórias e persistentes decepções. Percebendo que somos uma tribo de maníaco-depressivos com picos de euforia grandiloquente, arreigados na resistência à modernidade. E soube nivelar-nos por baixo, impondo a grandeza quantitativa e festiva, na nossa afeição à pequenez, capazes de sublimar num rectângulo de relva a compensação dos males e dos atavismos, regressando, depois e ordeiramente, à vida dura e mal paga, mas a dizermos mal do Estado e dos políticos. Agora, estamos na fase histérica do “patriotismo de bandeira”, é escusado contrariar-nos.
Portugal, neste Mundial, não tem equipa, não tem jogo, não vale um caracol. Ou seja, não é “competitiva”. Vive de uns laivos de inspirações momentâneas, tem tido uma sorte do caraças, sobrevive pela cobardia do anti-jogo e da bola para trás e para o lado. Se este povo gostasse mais de futebol que “da Selecção”, já tinha arreado as bandeiras das janelas, varandas, estendais e pópós. Mas ganhámos, ficámos em primeiro na série e vamos aos oitavos, com o prémio extra de evitarmos a Argentina. Se os holandeses estiverem em domingo não, mais á frente nos chegaremos. Até que a sorte proteja quem melhor joga futebol, o que, por vezes, também acontece. Entretanto, não nos roubam o patriotismo, a bandeira, a valorização do desenrascanço e do “interessa é ganhar”, Scolari, Sócrates e Cavaco, nossos líderes portuguesíssimos da mediocridade satisfeita. A ressaca fica para depois.
"Espero que a energia positiva que se tem vindo a criar em Portugal de norte a sul também seja utilizada para o desenvolvimento do país, para a recuperação da nossa economia, para o aumento do bem-estar da nossa sociedade."
Cavaco Silva, Braga, 19 de Junho de 2006.
Citação e imagem tiradas daqui.
Assistir a uma “pega” entre amigos com compromissos interiorizados relativamente á exigência intelectual é, por regra, “espectáculo” a não perder. Sobretudo em se tratando de um tema “quente”, com muitas componentes que “fervem”. Merecendo que as “pinças” fiquem arredias e se rompam as barreiras dos tabus – sejam eles do Ensino, da Ministra, dos Professores, dos Alunos, dos Educadores, dos Sindicatos ou dos Partidos-Sindicatos. Foi o caso do debate travado entre o Raimundo Narciso e o Manuel Correia a propósito da última greve dos professores. Obrigado aos dois [Reincidam se fazem favor].
E se me é permitida uma amiga e inocente colherada, sempre recomendo ao Manuel Correia que não reifique demasiadamente no post do Raimundo a percepção do “kitch da análise política” sobre o sindicalismo professoral, nomeadamente o praticado pela Fenprof. Vai aqui e encontrarás material para verificares como ele, o nosso comum amigo Raimundo, tem companhia a preceito, transformando, comparativamente, o peso do seu preconceito em coisa de somenos. É que, quando se perdem eleições, até os patronos do sindicalismo de protesto viram “anti-sindicais”. E, sendo assim, o que salva este "sindicalismo"? A menos que seja o único tabu permitido (à esquerda, é claro). Ministros e ministras é que não. Isso não.
Se me permitem, faço um intervalo. Deixo-vos um campo vazio de descanso com baliza aberta e sem guarda-redes. Quem quiser, aproveite e treine golos fáceis. Mas não vos dou tácticas para penalties de baliza aberta. Não sou Scolari e desisti de com ele aprender sequer amostra do que seja. Muito menos, com o seu patrioteirismo recitado e adoptivo de vivaço tipo “Igreja Maná”, na versão mariana-fatimista, em que eu seria aluno relapso e garantidamente chumbado. Ando demasiado ocupado no derby entre a água que quer jorrar vida das entranhas e a terra que teima em querer comer alguns dos que mais amo. Aos que aqui poisam com estima, peço paciência e que me dêem um tempinho para respirar e lutar. Gostaria de ser breve neste intervalo. Mas quem sou eu para mandar num jogo entre a água e a terra? Também nisso, sou adepto e treinador de bancada. Até depois.
Cada vez que Cavaco abre a boca, Sócrates comenta assim. Não me surpreende. Mas alguém quer explicar direito, de forma acessível que dê para entender, porque é que, oficialmente, Sócrates apoiou outra candidatura à PR? Se não sabem, não insisto. Ou antes, passo a outra pergunta, esta de resposta fácil: só os Poetas é que são uns fingidores?
Imagem colhida aqui.
OS MEUS BLOGS ANTERIORES:
Bota Acima (no blogger.br) (Setembro 2003 / Fevereiro 2004) - já web-apagado pelo servidor.
Bota Acima (Fevereiro 2004 a Novembro 2004)
Água Lisa 1 (Setembro 2004 a Fevereiro 2005)
Água Lisa 2 (Fevereiro 2005 a Junho 2005)
Água Lisa 3 (Junho 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 4 (Outubro 2005 a Dezembro 2005)
Água Lisa 5 (Dezembro 2005 a Março 2006)