Sábado, 21 de Maio de 2011
Sim, é (*), conforme se publicita, um romance sobre o assassinato de Trotsky pelo agente dos soviéticos Ramon Mercader escrito por um conhecido escritor cubano a viver e a escrever em Cuba. Mas essa parte que não seria pouca, de tal forma a excelência do resultado, é só um aspecto do último livro de Leonardo Padura, um dos grandes acontecimentos editoriais da primeira metade deste ano em Portugal. Porque o livro de Padura é mais do que o cruzamento entre as vidas e as mortes de Trotsky e Mercader (a presença deste agente do NKVD em terra cubana nos seus últimos quatro anos de vida, é pouco conhecida e é compreensivelmente nublada – repito: ele escreve e vive em Cuba - por Padura: a sua estadia foi a sua última missão de agente e esbirro policial, treinando os agentes da secreta castrista). Não só é também um “tratado” sobre a história da repressão soviética, o cerne do estalinismo, como transmite a atmosfera sórdida cubana e os seus traços de filiação na matriz comum que amarra os comunistas nos lugares onde o poder lhes calha nas mãos. Apesar de Trostsky e Mercader acabarem por adquirir alguma simpatia emprestada pela benevolência de Padura, o resultado é um notável fresco sobre a face negra do comunismo, o seu diagnóstico porventura mais demolidor e impressivo publicado até ao momento, sobretudo devido ao talento literário de Padura que torna a terrível história da repressão e do crime estalinista sob a forma palpável das vidas humanas (dos reprimidos e dos repressores). E é, para já e repetindo, o grande livro deste ano.(*) – “O homem que gostava de cães”, Leonardo Padura, Porto Editora