Manuel Serra, agora falecido, nunca teve um reconhecimento à altura da sua coragem demonstrada na luta contra a ditadura. Primeiro, porque não correspondia ao arquétipo do antifascista correcto. Era, antes, um voluntarista impaciente, um guerrilheiro sempre ansioso de acção. Vindo dos meios do activismo católico, entendia a ditadura como uma heresia perante deus e os portugueses que ele sabia, tendo nisso razão, que só cairia pelos canos das espingardas. Depois, logo a seguir ao 25 de Abril, enfiado no PS, tentou levar aquele partido para uma linha política à esquerda de Mário Soares, no que só foi manietado pelo verbo de Manuel Alegre que, arrastando a maioria do primeiro congresso do PS na legalidade, levou o PS a escolher Soares contra Serra. A que se seguiu uma dissidência inconsequente (a da FSP, que foi integrante de uma coligação eleitoral com o PCP) e a irrelevância posterior na intervenção política. Mas sem que, alguma vez, o tivessem visto a comer à mão dos poderes. Nenhum destes “assados” torna alguém, mesmo entre a esquerda, passível de admiração consistente e ampla, sequer com direito a lugar na memória. Mas mesmo os silêncios têm limites. E esses não apagam o facto de que acaba de nos deixar um dos mais intrépidos lutadores contra o fascismo, inclusive nos riscos do mata ou morre, barbaramente torturado pela PIDE em várias ocasiões, com longos anos de prisão, exílio e luta. A quem devemos, pelo menos, o exemplo do grito bravo em várias horas de muitas cobardias e omissões.
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