O caso do enraizamento de modalidades desportivas que não o futebol é deveras interessante. Além dos "grandes" que apostam em algumas destas modalidades (o que lhes dá público, competitividade e difusão) temos os casos de clubes "menores" ou específicos que fermentam a devoção desportiva de ligações a localidades e onde o futebol não tem dimensão de monta. Acontece sobretudo no hóquei, no andebol, no futsal e no basquetebol. Exigem menores custos de estruturas (um pavilhão) e em despesas com o plantel. No basquetebol, a única modalidade não-futebol que conheço relativamente bem, esse fenómeno verifica-se com força na região de Aveiro onde há várias localidades que se motivam à volta da sua equipa de basket. Também temos a Académica e o Barreirense, com fortes tradições (como já teve Queluz), recentemente Guimarães. Além do Porto e do Benfica que agigantam a dimensão competitiva da modalidade. Se formos para outras modalidades, idem. Ou seja, muitas localidades, ás vezes muito pequenas, polarizam-se desportivamente não pelo futebol mas por desportos alternativos. De que é prova, por exemplo, as massas de adeptos fanáticos da equipa de basquetebol que se encontram a apoiar a Académica e a Ovarense, entre outros clubes, inclusivamente acompanhando deslocações a outros pavilhões. Claro que estes enraizamentos têm altos e baixos, muitas vezes ao sabor dos apoios (que vêm e vão) e, sobretudo, pela disponibilidade dos dirigentes desportivos "carolas" que referiu, a qual também se processa em marés altas e baixas.
Daí o sucesso de um programa que agora saltou para a ribalta da televisão generalista, que havia descoberto ainda nos canais do cabo, a "Liga dos Últimos". Excelente fonte de análise sociológica, porque não dize-lo, do "fenómeno" futebol enquanto desporto de multidões, com raízes profundas, ao nível popular, desde inícios do século XX. Ali se podem constatar boa parte desses fenómenos que o João, refere: o da carolice e amadorismo de dirigentes, estruturas, adeptos, etc. também no dito "desporto-rei". Embora o programa reforce alguns aspectos das figuras ditas "bizarras" (até esse pormenor é delicioso), deu a conhecer a realidade no todo nacional que muitos desconheciam ou apenas conheciam localmente. Num país, cuja equipa principal de futebol disputa o acesso a um campeonato mundial, existem associações desportivas, cuja dimensão se reduz a uma equipa de futebol. Nestas mourejam jogadores do dito "copo e bucha", como era usual referir-se antigamente, como paga ou, então, como forma de complemento à sua base de rendimento - o seu trabalho - uns euros para ajudar a compor o pecúlio mensal, mas que congregam em seu redor boa parte da população local onde se inserem. Toda essa realidade é base da superstrutura que hoje importa e compra jogadores de boa parte do mundo, fazendo parte dessa "globalização futeboleira ", como melhor diria o famoso Bitaites " tripeiro. Filho das classes populares, o futebol, ajudou alguns dos seus - com arte, talento para a bola e sorte - na ascensão, alguns de forma fulgurante, na hierarquia social , embora muitas vezes esta seja apenas ilusão passageira. Tirando honrosas excepções. O processo evolutivo dessa estrutura de base - lento, vivendo na sua essência, como o João, bem refere, dessas "marés altas e baixas" que se alicerça na existência ou não de uns quantos carolas, com arte e engenho, que também procuram alguma projecção pessoal a nível local é, por isso e ainda, de um amadorismo atroz. Espero que a existência das novas faculdades de ciências do desporto venham, neste campo, a dar frutos num futuro próximo, se entendermos a sua real utilidade. A alternativa que refere em oposição à massificação do futebol seguida nalguns pontos do país pode ser interessante de seguir. Observo, com algum interesse, o novo velódromo em Sangalhos que pode vir a dar alguns frutos numa modalidade olímpica como é o ciclismo de pista coberta. Como nunca se conseguiu erigir o hóquei-em-patins , onde fomos reis e senhores durante décadas consecutivas, enquanto modalidade olímpica, esse poderia ser um interessante trabalho a desenvolver quer por dirigentes, quer por políticos, que se movimentam no interior do desporto em geral. Sabemos alguns dos porquês, mas que arrastariam a reflexão. Acompanhe-se então as diferentes e diversas opções alternativas e vejamos se os seus frutos são consequentes ou se apenas vivem do aparecimento cíclico de dirigentes com visão.
Abraço fraterno, João.