Domingo, 6 de Setembro de 2009

Um debate com efeitos colaterais

 

Louçã fez, hoje, um excelente e clarificador exercício de separação de águas entre direita e esquerda neste Portugal problemático e encurralado. Perante um dos rostos da responsabilidade pelo estado em que nos encontramos. Não terá sido convincente em termos de “medidas” (esse círculo fechado em que os três partidos que têm partilhado o poder gostam de esgotar o debate político, como se a política fosse uma espécie de reunião de um conselho de administração), para as quais lhe falta a ambição de partilha do poder (défice que comporta o impulso de uma atracão fatal pela escorregadela no demagogia e no populismo), mas sim ao nível do raciocínio político e do peso social dos interesses valorizados, especificando dois modos distintos de valorizar o protagonismo cidadão: a inclusão social como condição de qualidade mínima da democracia (perspectiva de esquerda) ou a prevalência do mercado e dos empresários como nó górdio da sociedade (até na prestação dos serviços públicos), de que resulta uma sociedade caótica com um assistencialismo mínimo e de emergência para suprir os ninhos de indigência gerados pelo capitalismo à solta (perspectiva de direita). Louçã que “deu aula” sobre esquerda/direita perante o rosto de MFL podia tê-lo feito (fá-lo-á certamente) perante Sócrates, substituindo uma ou outra referência, este ou aquele grau, esta ou aquela pincelada de equilíbrio e bom senso. Mas, ao bater politicamente MFL, o rosto não só do velho poder como também da velha cultura e da abencerragem catolicista nos costumes, Louçã atingiu Sócrates, em efeito colateral, pelo lugar que este quer ocupar, abusivamente, entre as forças de esquerda. Pois que a marca substancial que distingue Sócrates da esquerda foi colocado: o assistencialismo (sobre as franjas mais excluídas) como serviço de “limpeza” a uma sociedade com os interesses em roda livre no lugar da preocupação social como vector determinante da acção política e logo na sua fase de projecto. O que, diga-se, não iguala Sócrates e Manuela Ferreira Leite, que efectivamente não são “farinha do mesmo saco” e muito menos o são o PS e o PSD. Mas o que é não deixa de o ser: a líder do PSD é uma versão extremista, exagerada, mais dissonante com os novos problemas e desafios que a crise internacional impõe, impregnada de uma maior crueldade capitalista, mumificada culturalmente e plena de reflexos miméticos com o provincianismo reaccionário de Cavaco Silva, do PS-Sócrates. Mas a esquerda não passa pela diferenciação de grau dos componentes mais ao centro ou mais à direita. Sócrates, um centrista estrutural, provavelmente nunca o vai entender. Nem a sua corte de situacionistas vai permitir que tal aconteça.

 

Adenda para uma adenda: Pois, "nas tintas para a forma como as pessoas arranjam a sua vida sexualmente", desde que casamento à parte. Porque este é para procriar, segundo a senhora (não está no programa do PSD mas foi dito). Uma espécie de adepta do "amor livre" desde que off-record, é o que talvez MFL seja. 

 

Publicado por João Tunes às 22:57
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3 comentários:
De Marco Oliveira a 7 de Setembro de 2009
João,
Penso que há muitas pessoas que votaram PS há 4 anos e neste momento têm de optar entre PSD e BE. Parece-me óbvio que o Louçã se saiu melhor que a MFL. Mas eu sou dos que já estavam convencidos à partida...
De João Tunes a 9 de Setembro de 2009
Optar entre PSD e BE? Essa é boa.
De Filipe a 7 de Setembro de 2009
Não há dúvida que Louçã deu uma "tareia" na MFL, e agradeço-lhe (ao Louçã) por conseguir melhor do que nunca clarificar as intenções desta:

- Nem leu o programa do BE (Não respeita sequer a esquerda)
- Respeita a homosexualidade mas não aceita (é mentirosa, se respeitasse, aceitava)


Infelizmente 99% dos comentadores do debate são de direita ou extrema direita, acabando assim por injectar a informação errada na cabecinha dos eleitores.

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