Um dos nossos comentadores habituais (Augusto) colocou questões pertinentes na “caixa de comentários” deste post:
Analisando a evolução dos preços dos combustíveis no consumidor verifica-se que entre 2000 e 2008 o preço do gasóleo em Portugal subiu 100% contra 52% no conjunto dos 15 da UE. Como se explica?
Por outro lado como entender o facto do aumento do preço do barril de crude se repercutir de imediato no preço final do retalhista quando o combustível que está a ser vendido nos postos foi comprado pelo refinador uns meses atrás a preços inferiores?
Para a primeira questão (maior subida do gasóleo), a resposta é simples: sobem mais no mercado português os produtos com menos intervenção da refinação portuguesa. A actual estrutura refinadora instalada em Portugal e a concomitante escolha de “ramas” privilegia a saída de “leves” (o máximo de extracção de gasolinas). Daqui resulta que somos excedentários em gasolina (excedentes que se exportam e bem, sobretudo para os EUA) e deficitários em gasóleo e outros “pesados” (fuel oil). A gasolina colocada pela Galp no mercado português beneficia de dois factores igualmente favoráveis: é produzida nas refinarias portuguesas e beneficia de parte dela ter benefícios por exportação. No gasóleo, de que se importa uma parte significativa, a parte importada é comprada nos mercados internacionais, portanto sofrendo da vaga altista dos produtos refinados e sem gerar para a companhia resultados por refinação. A crescente transferência da motorização a gasolina para motorização diesel, questão que é endógena ao mercado de automóveis (implantada quando ao ter-se viatura a gasóleo se tinha benefícios que compensava o maior preço de compra dos automóveis diesel) e hoje estará em nítido contra-ciclo, veio agravar a dificuldade nacional em conter o preço do gasóleo, tanto mais que dependemos de importações de países com refinação exportadora de gasóleo e que, nos seus mercados, o sujeitam a menor subida de preço. Não se prevendo uma alteração na estrutura refinadora nacional e mantendo-se a preferência crescente por motorização diesel, a tendência é para que o gasóleo iguale ou ultrapasse o preço da gasolina (mais em Portugal que nos países onde a refinação gera excedentes exportados de gasóleo).
A segunda questão levantada pelo Augusto também tem resposta que, se permitir não se ofendendo, leva à “questão Estado”. Para segurança energética nacional, prevenindo uma calamidade em que o petróleo momentaneamente “desapareça” do mercado, há muitas décadas que o Estado português, como a maioria dos Estados, impõe à aprovisionadora e refinadora nacional (Galp) um stock de segurança que permita haver refinação e abastecimento do mercado nacional mesmo que durante alguns meses o país se veja privado da capacidade de se abastecer de petróleo bruto. São quantidades enormes que a Galp é obrigada a aprovisionar em permanência (o que nada tem a ver com uma gestão de stocks caso a companhia não tivesse o constrangimento imposto) e cujo custo de imobilização é enorme. Como a reposição de stocks é automaticamente obrigatória para manter o stock de segurança, se saem 100 toneladas para refinar, têm de entrar 100 toneladas para armazenar. Assim, em conta corrente, a companhia refinadora está sempre a comprar a preços do momento pelo menos a quantidade de produto que está a ser comercializada. E, em termos práticos, podendo estar a refinar produtos a “preços anteriores” (e inferiores), em custo de matéria-prima nas contas globais, é como se cada partida que sai para os postos de abastecimento tivesse sido refinado com o petróleo do “último preço” (pois o que se escoa do stock em refinados é compensado imediatamente no stock de matéria-prima com crude ao preço do momento).
De Augusto a 30 de Maio de 2008
Depois das explicações do João Tunes sobre o mercado petrolífero resolvi ler o Relatório da Galp Energia sobre os Resultados do 1º trimestre de 2008 para perceber quais eram, e de onde vinham, os "lucros escandalosos" da Galp referidos por alguns
blogues e jornais.
Vamos aos números, comparando o 1º trimestre de 2008 com o homólogo de 2007.
Os resultados operacionais foram no 1º trimestre de 2008 de 247 M€ contra os 179 M€ do período homólogo.
Sobre este resultado a Galp pagou em IRC ao Estado 73 M€, mais 29 M€ qie no período homólogo (+66,2%).
Exploração/Produção: + 25,2%
Refinação/Distribuição : + 20,5%
Gás/Energia: + 78,4%
TOTAL: + 37,8%
O aumento no segmento Exploração/Produção deve-se à venda de crude com origem em Angola onde a Galp tem participações.
No segmento Refinação/Distribuição verificou-se um decréscimo na margem de refinação e um abrandamento na procura de gasolina (-7,4%) e gasóleo (-2%) no mercado interno que foi compensado pelo aumento da exportação de gasolinas para os EUA (+ 29,4%).
No segmento Gás/Energia verificou-se uma subida importante dos resultados devido à maior procura de gás natural pelo sector eléctrico dada a baixa produtibilidade hidroeléctrica resultado da fraca pluviosidade registada neste período.
O resultado líquido foi de 175 M€ no 1º trimestre de 2008 contra os 149 M€ no período homólogo de 2007 ou seja + 22,9%. Mas se não considerarmos o "efeito stock" o resuiltado líquido foi de 109 M€ contra os 119 M€ obtidos no período homologo (- 8,4%).
A dívida total diminuiu, passando dos 841 M€ de 2007 para os 760 M€.
Aumentou o investimento em Exploração/Produção em
+ 29,6%
Adquiriu os negócios da Esso Espanola e da ExxonMobil Portugal.
Os custos com pessoal subiram 10,7%.
Será que aqueles que acusam a Galp de "lucros escandalosos" preferem um tecido empresarial constituido por empresas deficitárias, falidas, que não cumprem as suas obrigações perante a Segurança Social e o Fisco e que através dos despedimentos sobrecarregam o orçamento de Estado ?
Verdadeiramente interessante é a análise do "economista oficial" do PCP e, deputado de vez em quando, Eugénio Rosa.
Num texto da sua autoria escreve: "... é mesmo chocante numa altura em que são pedidos tantos sacrifícios aos portugueses, que a Galp tenha obtido um lucro extraordinário de 69 M€, ou seja mais 228,6% que em 2007 devido à subida do preço do petróleo..."
Ora a Galp é alheia à acentuada subida dos preços dos produtos petrolíferos no mercado internacional.
E não determina nem os preços do crude que compra no mercado (brent dated - Londres), nem o preço de venda dos refinados (cracking de Roterdão).
De resto estes ganhos são referidos e explicados no Relatório. Não há nada de opaco.
Mais adiante, servindo-se dos valores publicados pela DGEG sobre os preços dos combustíveis entre Janeiro de 2004 e Maio de 2008, conclui que : "os preços dos combustíveis em Portugal dispararam com a privatização da Galp".
Anda o ministro Manuel Pinho tão preocupado com a subida descontrolada dos combustíveis quando tem à mão a solução para o problema.
Nacionaliza a Galp e acaba com a subida de preço dos produtos petrolíferos.
Para os adeptos das "teorias conspirativas " devo esclarecer que não sou accionista nem tenho qualquer interesse na Galp.
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