Terça-feira, 27 de Maio de 2008

AINDA OS COMBUSTÍVEIS, PREÇOS E IMPOSTOS (1)

 

O impulso situacionista de Vital Moreira leva-o a parcialismos espantosos. Neste post, falando de impostos sobre combustíveis, VM concentra-se no facto de o ISP ser uma colecta fixa e silencia que o IVA é uma tributação percentual (agora de 21%, a partir de Julho será de 20%), portanto aumentando de acordo com os aumentos dos preços dos combustíveis. Assim, para se falar de “carga fiscal”, como VM faz, é necessário referir que o Estado recebe dos combustíveis vendidos um montante constante de duas parcelas (ISP+IVA), o que significa que, sendo a primeira fixa e a segunda percentual, o “imposto sobre combustíveis” sobe com a subida dos preços para os consumidores, agravando a contribuição fiscal de cada consumidor que paga um preço, não distinguindo nele o que é para isto ou para aquilo (e em Portugal, mais de metade do que se paga é receita para o Estado). Quanto à diversidade da tributação fiscal na Europa sobre os combustíveis, VM desvanece o caso espanhol como sendo “atípico” e a comparação com Espanha como “enganadora” (porque Espanha tem uma baixa carga fiscal). Mas, para ele, já não são “atípicos” os países em que a carga fiscal sobre combustíveis é superior se comparada com a situação portuguesa. E é claro, nem uma palavrinha sobre o sistema de dupla tributação em que o IVA é aplicado sobre um valor já sujeito a imposto. Que contorcionismo este!
 

Entretanto, convém ter em conta o que Sarkozy vai propondo e que é um indicador de que algo tem de ser feito para travar os efeitos mais desastrosos (sobretudo sobre actividades económicas) da vaga altista do petróleo. Vivendo-se numa nova época de “petróleo caro” (e este é o problema), algo de substancial tem de mudar nas estruturas de colecta fiscal instaladas na Europa no tempo ido do “petróleo barato”. Se a descida proposta para o IVA é discutível, enquanto medida generalista e favorável á tendência especulativa nos preços do crude, já a medida aludida de que os aumentos de receita do IVA sobre combustíveis (a parte que cresce pela aplicação percentual sobre preços cada vez mais altos), seja aplicada na ajuda a actividades económicas afectadas pela subida dos combustíveis, é uma das medidas com pernas para andar. O certo é que, politicamente e com imaginação, os Estados europeus e a Comissão Europeia têm de encontrar, e rapidamente, alternativas perante a crise petrolífera que terá vindo para ficar e agravar-se. O fixismo defensivo típico de um rígido “cobrador de impostos”, não mexendo nos tabus fiscais, é que não leva a lado nenhum, ou seja, leva à passividade perante o desastre. E, aqui, não querendo mexer na cobrança é sujeitar-se a cobrar menos por menos haverem para serem “cobrados”.

 

PS - Quando se fala de receitas do Estado português obtidas a partir do mercado petrolífero, omite-se, por regra, uma outra fonte de proventos importantes, além dos impostos, que também sustenta a coluna do "haver" das contas do Estado: a que advém da sua posição accionista na Galp. Além das mais-valias poderosas arrecadadas nas várias fases de privatização, sobretudo a última que levou a Galp para a Bolsa, nos últimos anos de lucros altos da Galp, o Estado tem recebido, de acordo com a sua posição remanescente de posse parcial da empresa, uma quantia em dividendos anual que não é nada insignificante como  enriquece constantemente o seu património em carteira de acções (falando-se, cada vez mais,  numa próxima etapa privatizadora em que novas mais-valias vão ser arrecadadas pelo Estado). Assim, além da cobrança alta de impostos que o Estado arrecada do conjunto do mercado dos produtos petrolíferos (nunca será demais repetir: mais de metade do valor cobrado aos consumidores, seja qual for a companhia abastecedora) , este beneficia em altas receitas e em valor patrimonial pela parte de capital que possui na Galp, pela elevadíssima subida das cotações bolsistas da Galp e pelas sucessivas vagas privatizadoras a  que tem sujeitado esta companhia

Publicado por João Tunes às 13:41
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1 comentário:
De Augusto a 28 de Maio de 2008
O Doutor Vital Moreira na sua ânsia de defender o governo parece cada vez mais Vasco Graça Moura durante o governo de Cavaco Silva.
A falta de rigor a analisar os valores do ISP não fica bem a um académico.
Ao contrário do que afirma no seu blogue a Espanha não é um caso atípico.
A Grécia, Luxemburgo, Austria, Irlanda e Itália têm valores de ISP e taxas de IVA inferiores a Portugal.
A Suécia e a Dinamarca com taxas de IVA superiores
têm, no entanto, valores de ISP inferiores.
E vários destes países, apesar da menor carga fiscal sobre os combustíveis, apresentam um superavit orçamental ao contrário de Portugal que apresenta um
défice.
Sendo o sistema de ensino, de saúde, de protecção social nesses países muito superior ao de Portugal, como se explica este "milagre" ?
Provavelmente o Estado gasta com mais parcimónia o dinheiro dos contribuintes e cobra de forma mais rigorosa, não havendo casos de milionários que declaram como rendimentos o ordenado mínimo nacional nem empresas que durante vários anos não pagam à Segurança Social e às Finanças.
Sobre este último aspecto há que reconhecer que o actual governo tem tentado pôr "a casa em ordem".
Quanto à afirmação de V.M. de que o ISP representa hoje uma percentagem menor no preço final é uma evidência de La Palisse.
Se o preço do combustível sobe, o ISP sendo um valor fixo, mantém o seu valor absoluto, mas desce
percentualmente. O que se esqueceu de referir é que o
valor de IVA cobrado SOBE.
Mas há um facto espantoso neste problema do custo dos combustíveis.
O ministro da economia diz não saber como são formados os preços dos combustíveis.
Entretanto mostra-se preocupado. Mas nós não precisamos de ministros preocupados. Precisamos, isso sim, de ministros actuantes, capazes de encontrar,
no plano político, soluções e de as explicarem à generalidade dos portugueses.
E muito mais estranho ainda é a AdC também não saber explicar como são formados os preços.
Não sabe, ou é politicamente incorrecto vir dizer que mais de 50% do preço no consumidor são impostos ?
É que, já em 2006, a AdC não sabia explicar a formação dos preços dos combustíveis e dizia não compreender a lentidão no ajustamento do preço dos combustíveis às quedas na cotação do crude e a rapidez no ajustamento quando se trata de subidas.
Aguardemos pelo final da semana para ouvir as explicações da AdC e do ministro.

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