Estive em Londres no pico do consumismo a célebre época dos saldos natalícios. Oxford Street e Regent Street transformam-se, nesta parte do ano, em formigueiros medonhos e sedentos de acederem à miragem de mel das compras em conta, do que se necessita e mais outro tanto por conta da boa conta. Mas diga-se que a fleuma e a disciplina, sem necessidade de imposição, tornam amenos e suportáveis estes excessos controlados. Acaba por só chocar o excesso e a trapaça da encenação comercial na indução ao consumo.
Mas Londres ainda conserva o bom figurino das lojas em desfile da rua, à maneira do que foi, como amostra, a antiga baixa lisboeta. Tirando dois grandes e paquidérmicos Armazéns, a escolha faz-se pelo caminhar avenidas com os olhos em mirada de monstras. Não lhes caiu (ainda?) no goto a febre grotesca e concentracionária dos nossos bem conhecidos
centros comerciais (a que, na minha banda, penduraram obscenamente o nome de
Fórum). Por outro lado, as compras ainda são actividade reservada a gente adolescente ou adulta, com os londrinos a evitarem transportar as crianças para o tropel das catedrais do consumo. Nem usam as nossas pacóvias peregrinações familiares com a tribo completa desde a avó agarrada à bengala até ao neto de colo, mais o apêndice do carrinho para as pausas do sufoco.
Se queremos ver as famílias londrinas em tribo, criança aos molhos e esfusiantes, então o melhor é rumar-se até aos excelentes museus londrinos, com destaque para o
Museu da Ciência e o
Museu de História Natural (com entradas gratuitas). Ambos são primores nos recheios, na animação, na tecnologia de interacção, no convite ao prazer inesgotável pelo saber, decifrar mistérios, cultivar fantasias, tentar ter o mundo na palma da mão e procurar ler-lhe os sinais, aprendendo-lhe as ruelas. Pois é, confirma-se, a grandeza tem de ser merecida. Ou um bom mote para o velho falatório sobre a querela acerca do eterno enigma do equilíbrio instável entre o Ter e o Saber.