Sexta-feira, 31 de Dezembro de 2010

ano novo, novo em quê?

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Publicado por João Tunes às 19:23
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Quinta-feira, 30 de Dezembro de 2010

O defensor do come e cala que um dia proclamou alto e bom som a insustentabilidade do país

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Certeiro como é seu uso e o talento ajuda, Manuel António Pina, no JN:

O "sensato" conselho de Cavaco Silva para comermos e calarmos de modo a que "os nossos credores" não se zanguem connosco e nos castiguem com juros cada vez mais altos espelha uma cultura salazarenta de conformismo que, sendo muito mais antiga que Cavaco, ele representa na perfeição, até nos seus, só na aparência contraditórios, repentes de arrogância.

Quando Cavaco nos recomenda que amouchemos pois "se nós lhes [aos 'nossos credores'] dirigirmos palavras de insulto, a consequência será mais desemprego para Portugal", tão só repete, adaptada à actual circunstância, a "sensata" e canónica fórmula do "Manda quem pode, obedece [ no caso, cala] quem deve".

Trata-se de uma atávica cultura em que a vida é vidinha, a crítica deve sempre ser "construtiva" e colaborante, os trabalhadores, por suave milagre linguístico, se tornam "colaboradores" (e se colaboracionistas melhor ainda) e servilismo e acriticismo são alcandorados a virtudes cívicas. Porque é assim que se faz pela vidinha, de joelhos.

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Publicado por João Tunes às 02:00
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Quarta-feira, 29 de Dezembro de 2010

Barroso, um “líder da estirpe mais qualificada”?

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É o que nos assegura VGM, um dos da estirpe mais servil:

Toda a gente tem consciência de que os horizontes do projecto europeu estão cada vez mais turvos. Há quem diga que é por falta de líderes. Não creio que a razão seja essa. Durão Barroso tem mostrado que ainda é um sobrevivente dessa estirpe mais qualificada, mas resta saber se isso lhe valerá (e nos valerá) de alguma coisa.

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Publicado por João Tunes às 19:45
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Terça-feira, 28 de Dezembro de 2010

Da ilha do socialismo oxidado

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O processo da decadência cubana levanta várias perplexidades. Uma destas é ver o “Granma” transformado em motivador do gosto pela posse de propriedade privada e a criação de uma nova camada de empresários, lá chamados de “cuentapropistas”. Azar dos “cubanistas” seguidistas que ainda vão ter de executar números assombrosos de contorcionismo retórico para explicarem o inexplicável, mais o inaceitável e o caduco.

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Publicado por João Tunes às 21:40
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Liu Xiaobo: mais um aniversário na prisão

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O Prémio Nobel da Paz 2010 passou o seu 55º aniversário numa prisão do nordeste da China, enquanto activistas dos Direitos Humanos renovaram os apelos para a libertação do dissidente.

Questionada sobre a situação, a porta-voz do Ministério dos Negócios Estrangeiros chinês, Jiang Yu, respondeu que «a China é um estado de Direito» e as acções do Governo visam «salvaguardar a soberania judicial» do país.

Liu Xiaobo, um antigo professor universitário e crítico literário, foi condenado em 2009 a onze anos de prisão por «actividades subversivas».

A organização Chinese Human Rights Defenders (CHRD), com sede em Hong Kong, assinalou o 55º aniversário de Liu Xiaobo com um comunicado apelando à «imediata e incondicional libertação» do dissidente.

A CHRD pediu também o levantamento das restrições impostas à mulher do Nobel da Paz, Liu Xia, sujeita a prisão domiciliária desde que o Comité Nobel Norueguês anunciou a atribuição do prémio ao marido, em Outubro passado.

Preso na cadeia de Jinzhou, a cerca de 450 quilómetros de Pequim, Liu Xiaobo foi distinguido «pela sua longa e não violenta luta pelos direitos fundamentais na China».

Para o Governo chinês, que qualificou aquela escolha como «um insulto aos órgãos judiciais da China», Liu Xiaobo «é um criminoso condenado por violar as leis chinesas».

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Publicado por João Tunes às 11:54
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Não está mal, para tempo de austeridade…

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Doze gestores públicos levam 1,6 milhões só em salários.

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Publicado por João Tunes às 02:10
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Calem-se! (não vá o mercado acordar…)

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Crise: Cavaco apoia Durão no apelo à contenção nos discursos.

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Publicado por João Tunes às 01:56
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Segunda-feira, 27 de Dezembro de 2010

Promete (mal) a longa ressaca da consoada

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Os economistas estimam que a trajectória de subida do desemprego ainda demore mais algum tempo a passar.

Depois de um ano difícil, com os sinais de recuperação da economia ainda fracos (o PIB avançou 0,3% no terceiro trimestre face ao anterior), e sendo o mercado de trabalho habitualmente o último a recuperar de um período de crise, as perspectivas para 2011 não são ainda optimistas.

De acordo com os últimos valores divulgados pelo INE, a taxa de desemprego em Portugal atingiu os 10,9% no terceiro trimestre de 2010, agravando-se dos 9,8% observados em igual período do ano passado.

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Publicado por João Tunes às 00:00
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Domingo, 26 de Dezembro de 2010

Mexia, o piedoso

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Há gente torta que, por vezes, escreve por linhas direitas. Zita Seabra, no JN:

Três dias antes do Natal, assistia calmamente ao Telejornal da RTP1 quando vi a grande notícia da noite. Entre os atentados em Bagdade e as agências de rating, uma voz off anuncia o que as câmaras filmam: o presidente da maior empresa pública portuguesa a levar dois saquinhos de papel com roupa usada e um brinquedinho (usado) para uns caixotes de cartão, cheios de coisas usadas para oferecer no Natal. Fiquei comovida. Que imagem de boa pessoa, que gesto bonito: pegar num fatinho usado do seu guarda-vestidos que deve ter uns 200 e num pequeno brinquedo de peluche, e depositar tudo no caixote de cartão para posteriormente ser redistribuído? À administração da empresa? Não, a notícia explica que é para oferecer aos pobrezinhos, que estão a aumentar com a crise. A RTP, Telejornal à hora nobre, filma o comovente gesto. Em off, o locutor explica o sentido dizendo que alguém vai ter no sapatinho um fato de marca. Olhando para os sacos de papel, percebe-se que esse alguém também receberá umas meias usadas e talvez mesmo uma camisa de marca usada.

Primeiro, pensei que estava a dormir e um pesadelo me fizera voltar ao tempo de Salazar, à RTP a preto e branco ou à série da Rita Blanco «Conta-me como foi».

Mas não, eu estava acordada e a ver o presidente da EDP no Telejornal da RTP 1 (podem ver o filme na net) posar sorridente para as câmaras, a levar um saquinho a um caixote, que não era de lixo, mas de oferta. Por acaso, estava à porta da EDP a RTP a filmar o gesto. Iam a passar e filmaram, certamente, porque para os pobres os fatos em segunda mão de marca assentam como uma luva. Um velhinho num lar de Vila Real vestido Rosa & Teixeira sempre é outra coisa. Ou o homeless na sopa dos pobres com Boss faz outra figura, ou o desempregado com Armani numa entrevista do fundo de desemprego... Mentalidade herdada do Estado Novo, foi a minha primeira análise, teorizando imediatamente que os ricos em Portugal, os que recebem prémios de milhões em empresas públicas e ordenados escandalosos e que puseram o mundo e o país como se vê, são os mesmos com a mesma mentalidade salazarenta. Mas nem é verdade, pois, mesmo nesse tempo, as senhoras do regime organizavam enxovais novos nas aulas de lavores do meu liceu para dar no Natal aos pobres que iam nascer.

Tantos assessores de imprensa na EDP, tantos assessores na Fundação EDP, milhões de euros gastos em geniais campanhas de marketing, tantas cabeças inteligentes diariamente pagas para vender a imagem do presidente da EDP, tudo pago a preço de ouro, e não concebem nada melhor do que mandar (!?) filmar, no espaço do Telejornal mais importante do país, um gesto indigno, triste, lamentável, que envergonha quem vê. Não têm vergonha? Não coraram? E a RTP que critérios usa no Telejornal para incluir uma notícia?

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Publicado por João Tunes às 22:32
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Sexta-feira, 24 de Dezembro de 2010

Natal com 2011 perto

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Publicado por João Tunes às 19:03
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Na mesa de natal: cortes, desigualdades, fomeca

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Manuel António Pina, no JN:

De acordo com dados do Ministério das Finanças citados pelo DN, o Governo estará por fim a conseguir reduzir o défice público (assim terá acontecido em Novembro), e isso graças, principalmente, "aos cortes nos apoios sociais a desempregados e crianças".

Entretanto Portugal alcançou já um honroso 2.º lugar no pódio dos países com maiores desigualdades sociais na UE e há hoje mais de 300 000 portugueses (entre eles milhares de crianças, que comem diariamente uma única refeição que lhes é servida na escola) a passar fome e dependendo, para sobreviver, de instituições como o Banco Alimentar, a Legião da Boa Vontade e outras, ou das espontâneas iniciativas de solidariedade que cidadãos anónimos, contando exclusivamente consigo, vêm promovendo um pouco por todo o país.

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Publicado por João Tunes às 15:28
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Quinta-feira, 23 de Dezembro de 2010

Clarificação a pedido

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1. Na "caixa de comentários" deste post, um interpelante (do pelotão dos "anónimos") desafiou-me com a seguinte pergunta:

A existência de um movimento comunista como o que «realmente existiu» trouxe alguma vantagem às classes sociais desfavorecidas do globo? Ou foi sempre uma agremiação de facínoras, criminosos e loucos?

2. Respondo-lhe assim:

O comunismo comporta uma praxis bipolar, consoante intervém na escalada até ao poder ou no exercício do poder. Quando projecto de acesso ao poder, os partidos comunistas fundamentam-se e entranham-se nas desigualdades sociais existentes e geradas pelo capitalismo, invocam os sentimentos mais generosos da humanidade, tornam-se paladinos, pelo menos formalmente e quando o sectarismo não os corrói, da civilização, da cultura, da liberdade, da democracia. Assim, fora do poder, digamos que enquanto pré-poder, e como regra, os partidos comunistas fazem parte das forças democráticas e do progresso, mais ou menos representativas, mais ou menos capazes de se unirem e promoverem a unidade na esquerda social e política. Quando acedem ao poder, na obsessão de o conservarem, os partidos comunistas desenvolvem automaticamente mecanismos paranóicos de tipo elitista e securitário, degradam-se rapidamente na forma de seitas autoritárias incapazes de governarem sem os mecanismos de terror, procedendo a passagens identitárias da classe operária para o partido, depois do partido para a direcção, muitas vezes da direcção para o dirigente máximo, terminando em estados policiais suportando ditaduras e servindo ideologias conformistas e conservadoras, alérgicos à liberdade, à democracia e aos direitos humanos, odiando particularmente a ideia da independência sindical e das autonomias operárias. Como o demonstra todos os casos de poder comunista, os partidos comunistas, ao governarem, transformam-se em “agremiações de facínoras, criminosos e loucos” (para utilizar os termos do meu interpelante). Porque o movimento comunista internacional, desde os tempos do Komintern, juntou partidos nas duas fases do comunismo, tendo de gerir o paradoxo da referida bipolaridade, desenvolveu como componente fundamental da sua propaganda a duplicidade na comunicação quanto aos seus projectos e intenções. Assim, consoante os interesses imediatos (os “interesses do partido”, os quais induzem os comunistas a viverem em paz com a mentira política contumaz), caso a caso, ora são democratas ora viram revolucionários, são patriotas nos intervalos do internacionalismo, contribuem para a unidade quando não são sectários, antiburgueses quando não são defensores da pequena (por vezes, até da média) burguesia, libertários quando não são contraditados. No caso de partidos em pré-poder mas com uma forte marca histórica de laços de subordinação hierárquica aos focos dos antigos poderes comunistas governantes (sobretudo quanto à URSS), como é o caso do PCP, as duplicidades são constantes e gritantes, na medida em que as fidelidades antigas (e que marcam as gerações mais antigas de dirigentes e foram passadas à “nova vaga bolchevique” como tradição caracterizadora e enquanto componente tutelar da vigilância leninista-sobrenatual da alma penada, pontifícia e santa de Cunhal) entram constantemente em colisão com as formulações políticas sobre a situação política interna. Defensor extremo da acção sindical, das garantias democráticas, das mais amplas liberdades, o PCP quando exprime a sua síntese sobre a história do comunismo e fala sobre os últimos bastiões do comunismo ditatorial que sobrevivem, entra em deriva esquizofrénica e defende nos seus “amigos”, “irmãos” e “camaradas” no poder todas as práticas que são exactamente o contrário do que teoricamente diz defender para Portugal e os portugueses. Mostram, assim, que não são sinceros, portanto não são fiáveis. E o PCP é, no panorama político português, independentemente dos quadrantes sociais, políticos e ideológicos em que se situa e exerce a disputa eleitoral, o partido mais falso, mais mentiroso e mais dúplice. Capaz de defender, aqui, os sindicatos, as greves, os direitos e as regalias, enquanto defende os seus confrades que dirigem as formas estatais mais selvagens de capitalismo e da globalização, bem como formas grotescas e monárquicas de perpetuar tiranias. Até que, hipótese sempre em aberto, o PCP seja capaz de se regenerar, democratizando-se e libertando-se da sua matriz “soviética”, sendo evidente que pode morrer da cura.

Quando acedem ao poder, assim foi em todos os casos realmente praticados, os partidos comunistas, depois de recomposições classistas das sociedades e assegurado o seu controlo, instalam um Estado de natureza assistencialista em que se asseguram transversal e igualitariamente a satisfação de necessidades básicas da população (emprego, saúde, ensino, habitação), produzindo então a grande diferenciação da prática estatal comunista face às iniquidades e arbitrariedades capitalistas. Alcançado este estádio, enquanto a sociedade evolui para a concentração do poder num restrito núcleo dirigente e domínio todo poderoso do aparelho policial, degradam-se os padrões de qualidade de vida, a sociedade elitiza-se com predomínio de nomenklaturas, destrói-se o sindicalismo independente e a auto-organização operária, a política e a intervenção cívica ritualizam-se e formalizam-se. Para o poder comunista, um polícia e um delator passam a ser muito mais importantes que um quadro sindical ou um autarca. Os padrões de vida e de participação degradam-se ao nível vegetativo da sobrevivência, muitas vezes arrastando-se pela via da indigência. Não são, nunca foram, padrões atractivos para os trabalhadores vivendo no capitalismo desenvolvido. Não impuseram qualquer mudança fundamental nos direitos e nas regalias dos trabalhadores. Quando havia o "império socialista", eram os trabalhadores destes países que olhavam com admiração e inveja para o nível e condições de vida, bem como direitos e regalias, dos trabalhadores da Europa capitalista rica e não o contrário.

Já nas sociedades em que os partidos comunistas estão na fase de pré-poder, os seus militantes, normalmente dominando os aparelhos sindicais, mobilizando os trabalhadores para a resistência à regressão social imposta pelos capitalistas e impulsionando novos direitos e mais regalias, o que constitui o húmus da ligação do social ao político e portanto da penetração comunista nas suas classes-alvo, são dos paladinos mais acirrados e combativos dos direitos operários. E, aqui, nas sociedades capitalistas, os comunistas sempre foram factores fundamentais para se ter atingido o actual patamar de condições laborais e de vida pelos trabalhadores, pressionando a social-democracia para a sensibilidade social e tentando despegá-la da sua atracção para governar com a direita e dentro do sistema capitalista.

Se os trabalhadores portugueses conservarem a sua velha sabedoria de nunca permitirem que os comunistas passem do contra-poder para o poder, nunca baixando a guarda para evitarem o risco de um dia virem a considerar como muito benévolas - social e politicamente - as passadas décadas de fascismo, sabem que contam com o PCP como factor de progresso, em muitos dos aspectos da vida cultural, social e política. Além de que, para os mais ecléticos, a leitura das manifestações de internacionalismo mumificado e esquizofrénico regularmente difundido pelo “Avante” pode ser uma fonte lúdica semanalmente actualizada de diversão pelo absurdo e enquanto uma das originalidades portuguesas ao conservar em bem entrado século XXI uma relíquia doméstica do estalinismo serôdio que é o quinto partido do arco parlamentar e recolhe à volta de 8% (!) das preferências do eleitorado.

(publicado também aqui)

Publicado por João Tunes às 23:16
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Olhando um dos lados da guerra civil de Espanha

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A guerra civil de Espanha (1936-39) foi o conflito internacionalizado que mais incendiou as paixões ideológicas em todo o mundo. Para isso, contribuiu decisivamente o facto de, nesta guerra, a propaganda ter desempenhado uma importância idêntica à da metralha. O Komintern, acabada de inaugurar a fase frentista antifascista e sob a ameaça do nazismo alçado ao poder, superada a fase sectária do “social-fascismo”, vivia uma fase de pujança e tinha refinado o papel da agitação e propaganda como factor de mobilização de quadros e simpatizantes. O fascismo mostrava na Europa uma capacidade notável de expansão e o anticomunismo das burguesias (mesmo as instaladas em regimes capitalistas democráticos), assustadas com o Komintern, empurrava estas para o compromisso preferencial com os regimes de força reaccionários, incluindo os fascistas ou fascizados. Esta divisão dicotómica, polarizada por formidáveis máquinas profissionais de propaganda, provocou um dos grandes factores trágicos da guerra civil espanhola: - o bando combatente do lado da legitimidade democrática (numa ampla frente que incluía republicanos burgueses, nacionalistas bascos e catalães, socialistas, comunistas e anarquistas) viu-se, com as excepções honrosas do governo mexicano e nos primeiros meses da contenda pelo governo francês, apoiado exclusivamente pela União Soviética, a que acrescia o aspecto caricato de, no início da guerra, o PCE ser um partido de expressão muito reduzida e não participante no governo republicano. Enquanto os golpistas, mais tarde aglutinados à volta de Franco, contaram com o apoio substancial e decidido das potências fascistas (Alemanha, Itália e Portugal) e a condescendência das democracias (que, nitidamente, preferiam uma vitória de Franco a uma vitória da república espanhola tutelada militarmente pela URSS). Como consequência, enquanto se combatia nas cidades e nos campos, rios e serras de Espanha, morrendo-se e matando-se, o mundo inteiro foi agitado e motivado por uma formidável disputa propagandística e ideológica, com separação contrastante entre “bons” e “maus”. O antifascismo só repetiria esta orgia propagandística e de recrutamento no final da segunda guerra mundial – a partir de 1943 - com a ofensiva de Exército Vermelho em Estalinegrado e após este ponto de reviravolta na balança bélica e quando seria reeditada a vaga de propaganda antifascista dirigida pelo movimento comunista internacional activada entre 1936 e 1939 à volta de Espanha (como se a "amizade germano-soviética" não tivesse existido e imperado entre 1939 e 1941 e, nos anos 30, Estaline não tivesse assassinado e prendido muitos mais comunistas que Hitler e todos os seus comparsas fascistas). O que não evitou que Espanha tivesse de esperar por 1975 para, pela morte de Franco na cama, retornar à democracia.

A intervenção da URSS e do Komintern em Espanha, abstraindo-se os aspectos épicos e românticos da mobilização antifascista, foi importante (pese embora ter sido limitada face às necessidades, insuficiente para contrabalançar os contributos bélicos de alemães e italianos e ter sido paga até à última peseta em ouro espanhol) e um acumular de absurdos. Importante porque a URSS foi o único fornecedor de material de guerra e especialistas militares ao lado republicano (para além do apoio modesto e longínquo do México) e, através do Komintern, o mobilizador dos brigadistas recrutados pelos comunistas de todos os países e o motor da agitação das opiniões públicas a favor da república espanhola mas como forma disfarçada de alargar a influência comunista (inclusivamente, funcionou também para suportar o enorme aparelho soviético de espionagem, sobretudo em Inglaterra e nos Estados Unidos). Sem este apoio, a República teria caído logo em 1936. Mas todo o apoio de Estaline a Espanha foi também (inevitavelmente?) uma demonstração dos absurdos perversos do regime paranóico comunista então sediado em Moscovo: - enquanto a democracia e o comunismo se batiam em Espanha contra o fascismo, Estaline decapitava o partido comunista soviético dos seus dirigentes leninistas e assassinava em massa dezenas de milhar de comunistas da base até ao topo; - Estaline transportou para a arena espanhola a sua paranóia securitária, dirigindo-a para a perseguição de anarquistas e trotsquistas espanhóis pela NKVD; - terminada a guerra civil em Espanha, com a derrota de Abril de 1939, Estaline fê-la seguir, ainda no mesmo ano da derrota, da assinatura do pacto germano-soviético (!) e da colaboração com a Alemanha na invasão repartida da Polónia, juntando-se aos nazis nos actos inaugurais da segunda guerra mundial; - enquanto se aliava aos nazis e com eles repartia a Polónia, Estaline ordenou a liquidação da maioria dos soviéticos que haviam estado em Espanha (diplomatas, propagandistas, generais, agentes de segurança) contra o nazi-fascismo, bem como dos comunistas de outras nacionalidades que se haviam refugiado na URSS (casos houve de comunistas alemães que transitaram do Gulag para campos de concentração nazi, por colaboração entre a NKVD e a Gestapo); - sempre utilitário, Estaline recrutou em Espanha o agente (o catalão Ramón Mercador) que iria, a seu mando, assassinar Trotski no México. E apesar do profundo envolvimento da URSS, do Komintern e de Estaline em pessoa nos mais variados aspectos da guerra e da governação republicana, quer nos seus aspectos mais heróicos como nos mais sujos e criminosos, o que lhes granjeou uma extraordinária influência, além do crescimento significativo da expressão do PCE, a "linha política" foi sempre de contenção na estratégia de conquista de poder por parte do comunismo espanhol, preferindo-se a condução profissional e disciplinada dos assuntos de guerra e a aliança frentista que suportava o poder republicano, combatendo o radicalismo impaciente, exigindo transformações sociais profundas e aceleração político-revolucionária, sobretudo impulsionado pelos anarquistas. Uma "linha" que Estaline corrigiria com afinco, quanto à "moderação espanhola", quando se repetissem as circunstâncias nos países europeus satelitizados pelo Exército Vermelho no final de segunda guerra mundial.

Os dramas, as intensidades e os absurdos gerados na e pela guerra civil de Espanha, deixaram um legado de continuidade do debate apaixonado sobre as partes e as causas. Daí que este conflito tenha gerado uma imensa bibliografia e provocado intermináveis debates e tomadas de posição. Que está muito longe de chegar ao seu termo. Pela riqueza dos factos e pela multiplicidade das paixões mas, também e sobretudo, pela quantidade impressionante de mitos difundidos para alimento das propagandas das partes e depois como consequência destas. Entretanto, com o assentar da poeira e o ganho da distância, bem como os factos estabilizadores trazidos pela renormalização democrática em Espanha, os historiadores continuam a ter enormes desafios pela frente: contarem a guerra baseando-se nos factos, desmontarem os mitos e a propaganda. Sabendo que aqueles e esta estão enterrados no chão de convicções conflituantes que atravessam várias gerações (e que sobrevive nos tempos actuais com a paixão de uma polémica dos tempos actuais). E aqui, naturalmente, ganha relevo o acesso a novas fontes ou fontes anteriormente interditas á consulta e à investigação. O historiador Stanley G. Payne (um reputado especialista em temas sobre Espanha), tendo tido acesso a arquivos soviéticos, tentou uma clarificação sobre a intervenção da URSS e dos comunistas (espanhóis e do Komintern) na guerra civil de Espanha e que, a nosso ver, resultou plenamente por desembocar numa sistematização interessante e que tardava sobre este aspecto fundamental acerca da guerra mais ideológica do século XX. Razão suficiente para recomendar vivamente a leitura da sua edição portuguesa (*).

(*) – “A Guerra Civil de Espanha, a União Soviética e o Comunismo”, Stanley G. Payne, Editora Ulisseia.

(publicado também aqui)

Publicado por João Tunes às 04:30
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homo seditiosus..

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A não deixar de se ler o post oportuno do Rui Bebiano em que se sublinha:

Combate-se nas ruas como Robin Wood e os seus se batiam nos arrabaldes de Nottingham, como um Zorro ficcional lutava em nome dos fracos e dos oprimidos: procurando mitigar a injustiça e exercendo por vezes o direito de vendetta. Sigo ainda Belpoliti: «Devemos preparar-nos para viver uma época diferente daquela que marcou a vida dos nossos pais e dos nossos avós, uma época que não possui um sentido único, ou pelo menos um destino preestabelecido.» Neste tempo, o homo seditiosus, o homem sublevado, apresenta-se como o campeão de uma humanidade que desce à rua. Hoje, mas igualmente amanhã, e depois de amanhã, para realizar «uma arte sem obra» determinada pelo direito à resistência. Uma perspectiva sobre a qual vale a pena ir meditando nos intervalos da acção.

(publicado também aqui)

Publicado por João Tunes às 03:44
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Quando Aconteceu uma "manobra contra-revolucionária"

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Há quem, passe o tempo que passar, não altere uma vírgula nas observações dogmatizadas sobre a realidade nem na sua catalogação na memória. São os estereotipados que tratam os tiques como estimação sectária, a que chamam, exercitando a auto-estima, firmeza e coerência. Os mais radicais entre estes, os cultivadores do congelamento histórico, não mexem sequer nos meneios da “linguagem de madeira” petrificada enquanto comunicação inter-partidária. Repare-se como passados trinta e cinco anos sobre o triste e célebre episódio do saneamento de jornalistas perpetrado pela direcção de Luís de Barros / José Saramago (e de que este último, pelo menos, se viria a envergonhar e disso dar público testemunho) no “Diário de Notícias” de então, Correia da Fonseca caracteriza (hoje!) o episódio a partir da sua tribuna no “Avante” a propósito do falecimento do jornalista Carlos Pinto Coelho:

Do Diário de Notícias [Carlos Pinto Coelho] foi demitido depois do 11 de Março de 75 por se ter deixado envolver numa manobra contra-revolucionária executada contra o próprio jornal por um grupo de jornalistas desagradados da própria Revolução.

(publicado também aqui)

Publicado por João Tunes às 03:02
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